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O Primo Basílio - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Eu conheço aquela cara. Tenho estado a ver se me recordo... Passava a<br />

mão pela testa. — Eu conheço aquela cara! Ele é de Lisboa. De Lisboa é ele!<br />

E depois de um silêncio, fazendo girar o guarda-sol:<br />

— E que há de novo, Sebastião?<br />

Também não sabia. Nem eu!<br />

E bocejando muito:<br />

— Isto está uma pasmaceira, homem!<br />

Nessa tarde, às quatro horas, Sebastião voltou à casa de Luísa. Estava com<br />

"o sujeito!" Ficou então preocupado. Decerto era algum negócio de Jorge; porque<br />

não compreendia que ela falasse, sentisse, vivesse, que não fosse no interesse da<br />

casa e para maior felicidade de Jorge. Mas devia ser grave então — para reclamar<br />

visitas, encontros, tantas relações. Tinham pois interesses importantes que ele não<br />

conhecia! E aquilo parecia-lhe uma ingratidão, e como uma diminuição de amizade.<br />

A tia Joana tinha-o achado "macambúzio".<br />

Foi ao outro dia que soube que o sujeito era o primo <strong>Basílio</strong>, o <strong>Basílio</strong> de<br />

Brito. O seu vago desgosto dissipou-se, mas um receio mais definido veio inquietá-lo<br />

Sebastião não conhecia <strong>Basílio</strong> pessoalmente, mas sabia a crônica da sua<br />

mocidade. Não havia nela certamente, nem escândalo excepcional, nem romance<br />

pungente. <strong>Basílio</strong> tinha sido apenas um pândego e, como tal, passara<br />

metodicamente por todos os episódios clássicos da estroinice lisboeta: — partidas<br />

de monte até de madrugada com ricaços do Alentejo; uma tipóia despedaçada num<br />

sábado de touros; ceias repetidas com alguma velha Lola e uma antiga salada de<br />

lagosta; algumas pegas aplaudidas em Salvaterra ou na Alhandra; noitadas de<br />

Colares nas tabernas fadistas; muita guitarra; socos bem jogados à face atônita de<br />

um polícia; e uma profusão de gemas de ovos nas glórias do Entrudo. As únicas<br />

mulheres mesmo que apareciam na sua história, além das Lolas e das Carmens<br />

usuais, eram a PisteIli, uma dançarina alemã cujas pernas tinham uma musculatura<br />

de atleta, e a Condessinha de Alvim, uma doida, grande cavaleira, que se separara<br />

de seu marido depois de o ter chicotado, e que se vestia de homem para bater ela<br />

mesma em trem de praça do Rossio ao Dafundo. Mas isto bastava para que<br />

Sebastião o achasse um debochado, um perdido; ouvira que ele tinha ido para o<br />

Brasil para fugir aos credores; que enriquecera por acaso, numa especulação, no<br />

Paraguai; que mesmo na Bahia, com a corda na garganta, nunca fora um<br />

trabalhador; e supunha que a posse da fortuna para ele, seria apenas um<br />

desenvolvimento dos vícios. E este homem agora vinha ver a Luisinha todos os dias,<br />

estava horas e horas, seguia-a ao Passeio...<br />

Para quê?... Era claro, para a desinquietar!<br />

Ia justamente descendo a rua, dobrado sob a pesada desconsolação destas<br />

idéias quando uma voz encatarroada disse com respeito:<br />

— Ó Sr. Sebastião!<br />

Era o Paula dos móveis.<br />

— Viva, Sr. João.<br />

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