O Primo Basílio - Unama
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— Estás tão linda! — Beijou-lhe o pescoço, encostou a cabeça ao peito dela.<br />
E com a vista muito quebrada:<br />
— O que eu sonhei contigo esta noite!<br />
Mas de repente, uma forte pancada de chuva fustigou os vidros. E<br />
imediatamente bateram à porta, com pressa.<br />
— Que é? — bradou <strong>Basílio</strong> furioso.<br />
A voz cheia de ss explicou que esquecera um cobertor na varanda que<br />
estava à secar. Se encharcasse, que perdição!...<br />
— Eu lhe pagarei o cobertor, deixe-me! — berrou <strong>Basílio</strong>.<br />
— Dá-lhe o cobertor...<br />
— Que a leve o diabo!<br />
E Luísa, sentindo um arrepio de frio nos seus ombros nus, abandonava-se<br />
com uma vaga resignação, entre os joelhos de <strong>Basílio</strong> — vendo constantemente<br />
voltada para si a face alvar do piloto.<br />
Assim um iate que aparelhou nobremente para uma viagem romanesca vai<br />
encalhar, ao partir, nos lodaçais do rio baixo; e o mestre aventureiro, que sonhava<br />
com os incensos e os almíscares das florestas aromáticas, imóvel sobre o seu<br />
tombadilho, tapa o nariz aos cheiros dos esgotos.<br />
Apenas Luísa começou a sair todos os dias, Juliana pensou logo: 'Bem, vai<br />
o gajo!"<br />
E a sua atitude tornou-se ainda mais servil. Era com um sorriso de baixeza a<br />
abrir a porta, alvoroçada, quando Luísa voltava às cinco horas. E que zelo! Que<br />
exatidões! Um botão que faltasse, uma fita que se extraviava, e eram mil perdões,<br />
minha senhora", "desculpe por esta vez", muitas lamentações humildes. Interessavase<br />
com devoção pela saúde dela, pela sua roupa, pelo que tinha para jantar...<br />
Todavia, desde as idas ao Paraíso, o seu trabalho aumentara: todos os dias<br />
agora tinha de engomar; muitas vezes era preciso ensaboar à noite colares,<br />
rendinhas, punhos, numa bacia de latão, até às onze horas. As seis da manhã, mais<br />
cedo, já estava com o ferro às voltas. E não se queixava; até dizia a Joana:<br />
— Ai! É um regalo ver assim uma senhora asseada!... Que as há! Credo!<br />
Não, não é por dizer, mas até me dá gosto. Depois, graças a Deus, agora tenho<br />
saúde; o trabalho não me assusta!<br />
Não tornara a resmungar da patroa. Afirmava mesmo à Joana repetidamente:<br />
— A senhora, ai, é uma santa! Muito boa de aturar... Não a há melhor!<br />
O seu rosto perdera alguma coisa do tom bilioso, da contração amarga. As<br />
vezes, ao jantar ou à noite, costurando calada ao pé de Joana, à luz do petróleo,<br />
vinham-lhe sorrisos súbitos, o olhar clareava-se-lhe numa dilatação jovial.<br />
— A Sra. Juliana tem o ar de quem está a pensar em coisas boas...<br />
— A malucar cá por dentro, Sra. Joana! — respondia com satisfação.<br />
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