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O Primo Basílio - Unama

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www.nead.unama.br<br />

O Saavedra pediu logo para abrir, porque o fazia com muito chique. E nas a<br />

rolha saltou, e, no silêncio que criou a cerimônia, se encheram os copos,<br />

O Saavedra, que ficara de pé, disse:<br />

— Conselheiro!<br />

Acácio curvou-se, pálido.<br />

— Conselheiro, é com o maior prazer que bebo, que todos bebemos, à<br />

saúde de um homem, que — e arremessando o braço, deu um puxão ao punho da<br />

camisa com eloqüência —, pela sua respeitabilidade, a sua posição, os seus vastos<br />

conhecimentos, é um dos vultos deste país. À sua saúde, Conselheiro!<br />

— Conselheiro! Conselheiro! Amigo Conselheiro!<br />

Beberam com ruído. Acácio depois de limpar os beiços, passou a mão<br />

trêmula pela calva, levantou-se comovido, e começou:<br />

— Meus bons amigos! Eu não me preparei para esta circunstância. Se a<br />

soubesse de antemão, teria tomado algumas notas. Não tenho a verbosidade dos<br />

Rodrigos ou dos Garretts. E sinto que as lágrimas me vão embargar a voz...<br />

Falou então de si, com modéstia: reconhecia, quando via na capital tão<br />

ilustres parlamentares, oradores tão sublimes, tão consumados estilistas; reconhecia<br />

que era um zero! — E com a mão erguida formava no ar, pela junção do polegar e<br />

do indicador, um 0: um zero! Proclamou o seu amor à pátria: que amanhã as<br />

instituições ou a família real precisassem dele — e o seu corpo, a sua pena, o seu<br />

modesto pecúlio, tudo oferecia de bom grado! Queria derramar todo o seu sangue<br />

pelo trono! — E, prolixo, citou o Euriko, as instituições da Bélgica, Bocage e<br />

passagens dos seus prólogos. Honrou-se de pertencer à Sociedade Primeiro de<br />

Dezembro... — Nesse dia memorável — exclamou —, eu mesmo as minhas janelas,<br />

sem o luxo dos grandes estabelecimentos do Chiado, mas com uma alma sincera!<br />

E terminou dizendo: — Não esqueçamos, meus amigos, como portugueses,<br />

de fazer votos pelo ilustrado monarca, que deu às neves da minha fronte, antes de<br />

descerem ao túmulo, a consolação de se poderem revestir com o honroso hábito de<br />

São Tiago! Meus amigos, à família real! — e ergueu o copo — à família modelo, que<br />

sentada ao leme do Estado, dirige, cercada dos grandes vultos da nossa política,<br />

dirige... — Procurou o fecho; havia um silêncio ansioso — dirige... — Através das<br />

lunetas negras, os seus olhos cravavam-se, à busca da inspiração, na travessa da<br />

aletria — dirige... — Coçou a calva, aflito; mas um sorriso clareou-lhe o aspecto,<br />

encontrara a frase; e estendendo o braço — ... dirige a barca da governação pública<br />

com inveja das nações vizinhas! A família real!<br />

— À família real! — disseram com respeito.<br />

O café foi servido na sala. As velas de estearina punham uma luz triste<br />

naquela habitação fria; o Conselheiro foi dar corda à caixa de música; e, ao som do<br />

coro nupcial da Lucia, ofereceu em redor charutos.<br />

— E a Sra. Adelaide pode trazer os licores — disse à Filomena.<br />

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