O Primo Basílio - Unama
O Primo Basílio - Unama
O Primo Basílio - Unama
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
— É brutal...<br />
— E caro!<br />
<strong>Basílio</strong> disse então:<br />
www.nead.unama.br<br />
— Olha que também é uma dos diabos, a pobre rapariga apanhada pela<br />
criada...<br />
Reinaldo estirou-se mais, e disse com júbilo:<br />
— Estão a estas horas a esgadanharem-se uma à outra!<br />
Recostou-se numa beatitude; quis saber as horas; declarou que estava<br />
confortável; que se sentia feliz! Contanto que o John se não tivesse esquecido de<br />
frapper o champanhe!<br />
<strong>Basílio</strong> torcia o bigode, calado. Revia a sala de Luísa de repes verde, a<br />
figura horrível de Juliana com a sua enorme cuia... Estariam com efeito a ralhar, a<br />
descompor-se? Que pulhice que era tudo aquilo! Positivamente devia partir.<br />
— Mas que pretexto lhe hei de eu dar para sair de Lisboa?<br />
— Um telegrama! Não há nada como um telegrama! Telegrafa já ao teu<br />
homem em Paris, ao Labachardie, ou Labachardette, ou o que é, que te mande logo<br />
este despacho: "Parta, negócios maus, etc." É o melhor!<br />
— Vou fazê-lo — disse <strong>Basílio</strong> erguendo-se, muito decidido.<br />
— E partimos amanhã? — gritou Reinaldo.<br />
— Amanhã.<br />
— Por Madri?<br />
— Por Madri.<br />
— Salero! — Pôs-se de pé na tina, entusiasmado, a escorrer, e com<br />
movimentos aduncos de magricela saltou para fora, embrulhou-se no roupão turco.<br />
O seu criado William entrou logo, sutilmente, ajoelhou-se, tomou-lhe um pé entre as<br />
mãos, secou-lho com precauções, pôs-se respeitosamente a calçar-lhe a meia de<br />
seda preta com ferradurinhas bordadas.<br />
Na manhã seguinte, um pouco antes do meio-dia, Joana veio bater<br />
discretamente à porta do quarto de Luísa, e com a voz baixa — desde o desmaio<br />
falava-lhe sempre baixo, como a uma convalescente:<br />
— Está ali o primo da senhora.<br />
Luísa ficou surpreendida. Estava ainda de robe de chambre, e tinha os olhos<br />
vermelhos de chorar; pôs num instante um pouco de pó-de-arroz, alisou o cabelo,<br />
entrou na sala.<br />
<strong>Basílio</strong>, vestido de claro, sentara-se melancolicamente no mocho do piano.<br />
Trazia um ar grave, e, sem transição, começou a dizer: — que apesar de ela se ter<br />
zangado na véspera, ele considerava ainda tudo "como dantes". Viera porque naquele<br />
momento não se podiam separar sem algumas explicações, sobretudo sem resolver<br />
definitivamente o caso da carta... E com um gesto triste, como contendo lágrimas:<br />
— Porque eu vejo-me forçado a sair de Lisboa, minha querida!<br />
174