O Primo Basílio - Unama
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www.nead.unama.br<br />
preparava ela? As vezes vinha-lhe uma onda de raiva; se fosse forte ou corajosa,<br />
decerto atirar-se-lhe-ia ao pescoço, para a esganar, arrancar-lhe a carta! Mas pobre<br />
dela; era "uma mosquinha"!<br />
Justamente, numa dessas manhãs, Juliana entrou no quarto — com o<br />
vestido preto de seda no braço. Estendeu-o na causeuse, e mostrou a Luísa, na<br />
saia, ao pé do último folho, um rasgão largo que parecia feito com um prego; vinha<br />
saber se a senhora queria que o mandasse à costureira.<br />
Luísa lembrava-se bem; rasgara-o uma manhã no Paraíso a brincar com<br />
<strong>Basílio</strong>!<br />
— Isto é fácil de arranjar — dizia Juliana, passando de leve a mão<br />
espalmada sobre a seda, com lentidão de uma carícia.<br />
Luísa examinava-o, hesitante:<br />
— Ele também já não está novo... Olhe, guarde-o pra você!<br />
Juliana estremeceu, fez-se vermelha:<br />
— Oh, minha senhora! — exclamou. — Muito agradecida! É um rico presente.<br />
Muito agradecida, minha senhora! Realmente... — E a voz perturbava-se-lhe.<br />
Tomou-o nos braços, com cuidado, correu logo à cozinha. E Luísa, que a<br />
seguira pé ante pé, ouviu-a dizer toda excitada:<br />
— É um rico presente, é o que há de melhor. E novo! Uma rica seda! —<br />
Fazia arrastar a cauda pelo chão, com um frufru. Sempre o invejara; e tinha-o agora,<br />
era o seu vestido de seda! — É de muito boa senhora, Sra. Joana, é de um anjo!<br />
Luísa voltou ao quarto, toda alvoroçada; era como uma pessoa perdida de<br />
noite, num descampado — que de repente, ao longe, vê reluzir um clarão de<br />
vidraça! Estava salva! Era presenteá-la, era fartá-la! Começou logo a pensar no que<br />
lhe podia dar mais, pouco a pouco: o vestido roxo, roupas brancas, o roupão velho,<br />
uma pulseira!<br />
Daí a dois dias — era um domingo — recebeu um telegrama de Jorge:<br />
"Parto amanhã do Carregado. Chego pelo comboio do Porto às seis." Que<br />
sobressalto! Voltava, enfim!<br />
Era nova, era amorosa — e no primeiro momento todos os sustos, as<br />
inquietações desapareceram sob uma sensação de amor e de desejo, que a<br />
inundou. Viria de madrugada, encontrá-la-ia deitada — e já pensava na delícia do<br />
seu primeiro beijo!...<br />
Foi-se ver ao espelho: estava um pouco magra, talvez com a fisionomia um<br />
pouco fatigada... E a imagem de Jorge aparecia-lhe então muito nitidamente, mais<br />
queimada do sol, com os seus olhos ternos, o cabelo tão anelado! Que estranha<br />
coisa! Nunca lhe apetecera tanto vê-lo. Foi logo ocupar-se dele; o escritório estaria<br />
bem arranjado? Quereria um banho morno; seria necessário aquecer a água na tina<br />
grande!... E ia e vinha, cantarolando, com um brilho exaltado nos olhos.<br />
Mas a voz de Juliana, de repente no corredor, fê-la estremecer. Que faria<br />
ela, a mulher? Ao menos que a deixasse naqueles primeiros dias gozar a volta de<br />
Jorge, tranqüilamente!... Veio-lhe uma audácia, chamou-a.<br />
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