O Primo Basílio - Unama
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CAPÍTULO XI<br />
www.nead.unama.br<br />
Foi por esse tempo que, num sábado, o Diário do Governo publicou a<br />
nomeação do Conselheiro Acácio ao grau de Cavaleiro da Ordem de São Tiago,<br />
atendendo aos seus grandes merecimentos literários, às obras publicadas de<br />
reconhecida utilidade, e mais partes...<br />
Na noite seguinte, ao entrar em casa de Jorge, todos o cercaram, felicitandoo<br />
com alarido; o Conselheiro, depois de os abraçar um por um, numa pressão<br />
nervosa e comovida, caiu no sofá, exausto, e murmurou:<br />
— Não o esperava tão cedo da real munificência! Não o esperava tão cedo!<br />
— e acrescentou, pondo a mão espalmada sobre o peito: — Direi como o filósofo:<br />
"Esta condecoração é o melhor dia da minha vida!"<br />
E convidou logo Jorge, Sebastião e Julião para um jantar na quinta-feira, um<br />
modesto jantar de rapazes, no seu humilde tugúrio, para festejarem a régia graça.<br />
— Às cinco e meia, meus bons amigos!<br />
Na quinta-feira, os três, que se tinham encontrado na Casa Havanesa, eram<br />
introduzidos por uma rapariguita vesga, suja como um esfregão, na sala do<br />
Conselheiro. Um vasto canapé de damasco amarelo ocupava a parede do fundo,<br />
tendo aos pés um tapete onde um chileno roxo caçava ao laço um búfalo cor de<br />
chocolate; por cima uma pintura tratada a tons cor de carne, e cheia de corpos nus<br />
cobertos de capacetes, representava o valente Aquiles arrastando Heitor em torno<br />
dos muros de Tróia. Um piano de cauda, mudo e triste sob a sua capa de baeta<br />
verde, enchia o intervalo das duas janelas. Sobre uma mesa de jogo, entre dois<br />
castiçais de prata, uma galguinha de vidro transparente galopava; e o objeto em que<br />
se sentia mais o calor do uso era uma caixa de música de dezoito peças!<br />
O Conselheiro recebeu-os, com o hábito de São Tiago sobre a lapela do<br />
fraque preto. Havia outro sujeito na sala, o Sr. Alves Coutinho. Era picado das<br />
bexigas, tinha a cabeça muito enterrada nos ombros; quando o seu olhar parvo se<br />
fixava nas pessoas, com pasmo, o seu bigode pelado arreganhava-se logo por<br />
hábito, num sorriso alvar que mostrava uma boca medonha cheia de dentes podres;<br />
falava pouco, esfregava sempre as mãos, concordava em tudo; havia nele o ar de<br />
um deboche banal e de um embrutecimento antigo. Era um empregado do ministério<br />
do Reino, ilustre pela sua boa letra.<br />
Daí a pouco entrou a figura conhecida do Saavedra, redator do Século. A<br />
sua face branca parecia mais balofa; o bigode muito preto reluzia de brilhantina; as<br />
lunetas de ouro acentuavam o seu tom oficial; trazia ainda no queixo o pó-de-arroz,<br />
que lhe pusera momentos antes o barbeiro; e a mão, que escrevia tanta banalidade<br />
e tanta mentira, vinha aperreada numa luva nova, cor de gema de ovo.<br />
— Estamos todos! — disse com júbilo o Conselheiro. E curvando-se: —<br />
Bem-vindos, meus amigos! Estamos talvez mais à vontade no meu quarto de<br />
estudo! Por aqui. Há um degrau, cuidado! Eis o meu Sancra Sancrorum!<br />
Numa saleta muito espanejada a que as cortinas de cassa, a luz de duas<br />
janelas de peitoril e o papel claro davam um aspecto alvadio, estava a larga<br />
escrivaninha de trabalho, com um tinteiro de prata, os lápis muito aparados, as<br />
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