UNIJUSMINIMALISMO E PRINCIPIOLOGIA PENALDe outra parte, a explicação psicanalíticade punição contradiz a lógica daressocialização. Para a psicanálise, assanções segregacionistas são resultadodo fenômeno psíquico da construção de‘bodes expiatórios’, em que se utiliza ocriminoso como um elemento catalizadorde nossas culpas pessoais, descarregandoparte de nossas energias psíquicasnegativas.Na perspectiva marxista, por suavez, pode se dizer que a ressocializaçãoé normalização, adequação do indivíduoao modo de produção dominante e aomodo de vida social capitalista, destinadoà manutenção do status quo. Portanto,só se poderia pensar numa idéia legítimade normalização após se implementarum conjunto de transformaçõessociais que alterassem as relações capitalistasde produção e vida social.De qualquer maneira, deve-se conjugaras diversas críticas, de modo quea ressocialização só pode ser compreendidaa partir de um processo de interaçãoentre indivíduo e sociedade. Assim, se oindivíduo é fruto de uma conjunção dosfatores ambientais (sociais) com os fatorespsíquicos (individuais), a puniçãoressocializadora mitifica a sociedade, poisnão a avalia. Em outras palavras, faz-seuma avaliação negativa do indivíduo delinqüente,mas não se avalia conjuntamente,de maneira proporcional, o meioque produz a delinqüência.Por fim, qualquer sociedade (e maisainda aquelas que se predispõem a serdemocráticas e pluralistas) é constituídade um conjunto diversificado de ordensde valores, muitos dos quais dizem diretamenterespeito à vida social. A eleiçãoarbitrária de um modelo de sociedade aser seguido para o atendimento do objetivode ressocialização (já que esta significariaa volta à sociedade ‘normal’) implicauma ofensa à idéia de pluralidadede pensamentos (cuja existência não foisuprimida nem mesmo por regimes totalitários,tendencialmente aniquiladoresdas diferenças).Assim sendo, a idéia criminológicaclínica de tratamento ressocializador, deterapia ressocializadora, tem algo de totalitária,violando o direito humano fundamentalde ‘ser o que se quer ser’, coroláriológico da liberdade. O fato de que o indivíduotenha cometido uma violação dosdireitos de outrem não pode ser bastantepara que se lhe imponha um modo de vidasocial definido arbitrariamente.De outra parte, a internação carcerária,total ou parcial, prevista nas penasprivativas de liberdade, gera o fenômenoda ‘prisonização’ (Clemmer), acarretandono preso a inserção num modo devida que, longe de ser ressocializadorsegundo um suposto padrão de normalidadesocial, é consagrador da vida delinqüente.O meio prisional reproduz e multiplicaas condutas e os hábitos consideradosdelinqüentes. Isso porque a vidapor um continuado período no cárcerepressupõe que o indivíduo consiga formarlaços de convivência que lhe permitam‘existir’ dentro daquele universo devida. E tais laços são reprodutores dacultura comportamental delitiva.Por conseguinte, o preso carrega consigo,a partir do apenamento segregador,a ‘contaminação’ por outras condutas ecomportamentos criminais que não osseus, os efeitos da estigmatização social,o sofrimento causado à família. Issocomunmente neutraliza imediata oumediatamente qualquer efeito benéficoque porventura a prisão poderia ter.134
Não obstante todo esse contexto,não se deve menosprezar o papel sócioculturalque as penas, em especial as privativasde liberdade, desempenham navida humana. Através dela se impõe limitesà ação de cada um e de todos naconvivência social, garantindo uma respostasimbólica ao excesso ilegítimo 7 deliberdade.A idéia de apenamentos representaum importante papel simbólico na sociedade,pois garante ao Estado, mesmo quefragilmente, um papel social de ‘nomedo pai’, um limitador ao princípio do prazer,impondo aos sujeitos o limite da realidade.Assim, a demonstração de que o ‘tratamento’ressocializador é um mito ideológiconão se justifica concluir (comofaz o abolicionismo) que deve ser pura esimplesmente extinta a pena prisional. Ocaminho mais lógico passa por outra lógica:enxugar a esfera penal; priorizarapenamentos alternativos; redimensionare redirecionar profundamente o sistemapunitivo de privação da liberdade. 84PAUTAS DE DESCRIMINALIZAÇÃOA postura minimalista, aqui adotada,propugna a construção de novos paradigmaspara o Direito Penal. Tal construçãose daria como um processo dialético,portanto, ilimitável temporalmente,em constante renovação. Partiria, porém,MINIMALISMO E PRINCIPIOLOGIA PENALUNIJUSde um conjunto de diretrizes que podemser chamadas, na linha de Cervini, 9 de‘pautas de descriminalização’.À primeira diretriz, de caráter gerale envolvendo as três seguintes, chamasedesinstitucionalização. Trata-se daidéia reformadora que tende a desinstitucionalizaras respostas punitivas (o queresultaria ter a menor quantidade de presospossível), a institucionalizá-las somenteem casos extremos. Consistiria emretirar dos órgãos oficiais, sempre quepossível, a competência para a soluçãodos conflitos de caráter penal.À segunda diretriz chama-se descriminalização.10 Descriminalização significatirar o caráter de ilícito penal de umacerta situação de vida. Um fato abstratamenteconsiderado deixaria de ser tratadocomo crime.Pode-se falar em descriminalizaçãoformal, que sinaliza o desejo de outorgarum total reconhecimento legal e socialao comportamento descriminalizado.Não há punição nenhuma para a conduta,ou seja, é retirada de qualquer puniçãoestatal a conduta, deixando de serpunida em qualquer esfera jurídica.Há, ainda, a descriminalização substitutiva,em que as penas são substituídaspor sanções de outra natureza, como,por exemplo, a transformação ou restriçãode delitos de pouca importância emilícitos administrativos ou fiscais punidoscom multas ou outras medidas decaráter disciplinar. É aquela em que se____________________7 Entende-se como ilegítimo o excesso de liberdade que represente intervenção não autorizada da ação de um indivíduo sobre os direitos de outrem,lesionando-os ou causando-lhes um perigo de lesão.8 Evidentemente, tais idéias suscitam uma gama considerável de reflexões, não sendo este, no entanto, o objeto deste artigo.9 Raúl CERVINI, Os processos de descriminalização.10 Não há consenso quanto ao uso das palavras ‘descriminalizar’ ou ‘descriminar’. Trabalhando-se a partir dos antônimos, tem-se que descriminaré o contrário de incriminar, que significa imputar um crime a alguém. Assim, descriminar significaria absolver, tirar a culpa, inocentar, absolverda imputação do crime. Descriminalizar, por sua vez, seria o contrário de criminalizar, de tornar criminal. Por decorrência, opta-se, aqui, pelapalavra descriminalizar.135
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