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O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA

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os galos bebem a tristeza da lua.<br />

Os grilos fecundam as plantas,<br />

os manacás soluçam sob as estrelas.<br />

O mundo distante, as almas suspensas. (MS, p. 16)<br />

Como percebemos, há no trato da sintaxe um caráter de ruptura, com a junção de<br />

inúmeros elementos que não apresentam ligações entre si. De linguagem dúbia e subjetiva, o<br />

referido poema retrata, através da visão do poeta, o pequeno vilarejo em que o eu lírico<br />

mostra, de forma telúrica, como a vida interiorana é pacata, através de construções<br />

terminantemente poéticas, em que “a tristeza da lua” é bebida e as plantas são fecundadas<br />

pelos grilos. O hermetismo atinge aí um alto grau, valendo-se o autor da prosopopéia para<br />

promover um maior sentimentalismo quando dos elementos no poema citados, como os<br />

“manacás” que “soluçam sob as estrelas”, humanizando assim tais seres.<br />

117<br />

Essa vertente simbolista é detectada com nitidez em alguns poetas modernistas,<br />

como atestam Antonio Candido e Aderaldo Castello, que afirmam que muitos poetas do<br />

Modernismo mantiveram “inspiração simbolista, alguns dos quais colaboraram na revista<br />

luso-brasileira Terra do Sol (1924-1925) e depois, em 1927, publicariam Festa (Andrade<br />

Muricy, Tasso da Silveira, Murilo Araújo, Adelino Magalhães, Cecília Meireles)”. 126 Rivera<br />

impõe em seu poema o espírito confuso e individualista da poesia simbolista, sugerindo sem<br />

nomear objetivamente os elementos ou acontecimentos da realidade. Mas nesse ponto ele<br />

chega mais próximo ainda da poesia surrealista, com a construção de um ambiente totalmente<br />

voltado para o campo psicológico, escolhendo as imagens oriundas de possíveis lembranças<br />

para eficientemente chegar a um pensamento idealizado. 127 Tais construções, fugindo do<br />

meramente real, desembocam em uma metafísica similar ao que fora feito por esse tipo de<br />

arte literária (surrealista), como bem exemplifica o seguinte conceito:<br />

Do ponto de vista da técnica, o Surrealismo se apropria da desinibição dadaísta,<br />

quer no emprego de procedimentos fotográficos e cinematográficos, quer na<br />

produção de objetos “de funcionamento simbólico”, afastados de seus significados<br />

habituais, deslocados (o ferro de passar cheio de pregos, a xícara de chá forrada de<br />

pele). Todavia, também se utilizam as técnicas tradicionais, principalmente entre os<br />

artistas mais interessados no conteúdo onírico das figurações, seja porque, sendo de<br />

uso correto, prestam-se muito bem à “escrita automática”, seja porque a<br />

normalidade ou mesmo a banalidade da imagem isolada ressalta a incongruência ou<br />

o absurdo do conjunto (como quem narra as coisas mais incríveis da maneira mais<br />

normal e aparentemente objetiva). 128<br />

126 CANDIDO, Antonio & CASTELLO, J. Aderaldo. Presença da literatura brasileira: modernismo. p. 13<br />

127 Conf. BERGSON. Matéria e memória, p. 209<br />

128 ARGAN, Giulio Carlo. Arte moderna: do iluminismo aos movimentos contemporâneos. p. 361

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