O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
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No mapa, meus olhos seguem os teus caminhos abstratos,<br />
rosa dos hemisférios!<br />
Nenhuma aurora anuncia a tua vinda<br />
mas a tua presença é múltipla e real.<br />
Florescem teus pés em cada porto.<br />
Andas e cresces, flor do enigma,<br />
as pétalas no céu, o caule sobre o mar.<br />
Nasce um lírio no Volga.<br />
Uma criança chora, a estrela desce<br />
meiga, pousa no berço, a criança sorri.<br />
É a filha do rio heróico. Ó barqueiros, cantai!<br />
A madrugada escolar em Káunas. Duas tranças<br />
e a fita como um pássaro voando no retrato.<br />
A neve nos telhados, um rosto na vidraça,<br />
Árvores de gelo na distância<br />
e os teus brinquedos nevando na memória...<br />
Cantam junto à lareira as quatro irmãs.<br />
Embarcas na música, docemente viajas,<br />
a face vogando no outro lado do mundo.<br />
Um trem na fronteira.<br />
O tio pálido, as primas chorando, o adeus.<br />
Longe, Mariâmpolis dormindo<br />
e os teus avós rezando na profunda Rússia.<br />
E voas sobre o mar. És pomba, arco-íris,<br />
sinal do céu, rosa boiando, lua<br />
sobre as âncoras, os peixes e os corais.<br />
Salve a imigrante! Ela caminha<br />
pura e serena ao encontro do afogado. (LP, p. 43-4)<br />
Utilizando-se de alguns dos Leitmotive do seu fazer poético, Rivera mostra, de<br />
forma bela e autêntica, a trajetória de Ângela a partir de seu lugar de origem, focalizando<br />
especialmente a questão da viagem marítima por ela enfrentada até chegar à América do Sul.<br />
De fato, Ângela, de origem Lituana, veio com a família por causa da guerra havida na Rússia,<br />
tendo sua família fixado residência em Minas Gerais. É assim que Bueno de Rivera fala na<br />
“rosa dos hemisférios”, usando aí tanto um nome floral para aquela por quem ele se<br />
apaixonou, quanto um vocábulo indicador da travessia por ela realizada, já que ao falar dessa<br />
forma, dá-se a impressão de que ela pertencia a ambos os lados do planeta. Provavelmente,<br />
por causa da migração, é como se a esposa se sentisse pertencente a ambos os hemisférios,<br />
pois nascera e tivera sua infância no Norte, mas sua maior vivência fora no Sul; daí é que<br />
surge a conjectura de uma viagem inter-hemisférica (de Norte a Sul), implicitamente colocada<br />
no poema. Esta referência ao hemisfério Norte é também evidenciada em outro poema de Luz<br />
do pântano, “Ângela no Porto de Santos”, em que diz: “Eras a rosa do norte entre os roteiros”,<br />
referindo-se à sua esposa.<br />
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