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O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA

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foram seus ossos, os sapatos, os cabelos e flores secas ali depositadas quando do seu<br />

sepultamento. Rivera apresenta-se aqui bastante realista, mostrando de forma clara que o<br />

corpo morto, ali jazido, sofreu decomposição de sua estrutura física. Entretanto, rapidamente<br />

verte o seu raciocínio para o lado transcendental da morte – percebamos que esse intuito já<br />

vem proposto desde o título do poema –, pois coloca o eu lírico a indagar sobre a “essência”<br />

do amigo, e não mais apenas pelo seu corpo. Por achar o seu túmulo um “Frasco vazio”,<br />

apesar de nele ainda conter os restos mortais do defunto, vemos que ele procurava, na<br />

verdade, a anima daquele corpo, o seu modo de ser, ou como ele mesmo fala, a sua<br />

“essência”.<br />

Esse indagar realizado pelo eu lírico do poema é a base para o entendimento do<br />

homem como um ser existencial. Conforme Heidegger, “Enquanto ser-para-o-fim, o findar<br />

reclama um esclarecimento ontológico haurido no modo de ser da presença”. 93 Isso significa<br />

que, para entendermos o fim, necessário se faz que saibamos algo sobre a existência, sobre a<br />

presença do ser; assim sendo, Rivera também, não caindo no simples idealismo metafísico,<br />

procura entender, ao lado da essência, a existência do ser, de forma ontológica. É nesse intuito<br />

que ele inicia a terceira estrofe do trecho escolhido, baseando-se nas leis que regem os corpos<br />

materiais, onde a matéria viva, entrando em decomposição, pode entrar na constituição de<br />

outro ser vivo. Toda essa terceira estrofe é de intenso teor niilista, pois traz somente a noção<br />

da finitude do corpo humano; e é terminantemente niilista porque a transformação do amigo<br />

“Talvez num verme”, “Talvez num lírio”, não é dada por meio de uma transubstanciação – o<br />

que novamente nos poria no campo da metafísica –, mas pela simples decomposição do corpo<br />

em partículas minúsculas que seriam, por sua vez, aproveitadas por outras formas vivas, num<br />

incessante processo biológico mantenedor da vida como a conhecemos.<br />

Essa é uma relação sobre a qual inúmeros outros escritores já haviam falado por<br />

todo o globo; como exemplo, podemos citar o dramaturgo inglês William Shakespeare, que<br />

na famosa peça teatral Hamlet profere, na voz do personagem homônimo, quando lhe<br />

perguntam a respeito do cadáver de Polônio por ele assassinado:<br />

93 HEI<strong>DE</strong>GGER, Martin. Ser e tempo II, p. 26-7<br />

REI: Onde está Polônio?<br />

HAMLET: Numa ceia.<br />

REI: Numa ceia? Onde?<br />

HAMLET: Não onde come, mas onde é comido.<br />

Certa assembléia de vermes políticos está com ele agora: o verme é o único<br />

imperador da dieta, cevamos todas as demais criaturas para que nos engordem, e<br />

nós nos cevamos a nós mesmos para as larvas. O rei gordo e o mendigo<br />

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