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O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA

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por lutar pelos ideais republicanos no Brasil colônia. Observemos o relato de Júlio Chiavenato<br />

sobre o referido episódio histórico:<br />

147<br />

Declaram o réu infame e seus filhos e netos, tendo-os, e os seus bens, aplicam o<br />

Fisco e a Câmara Real, e a casa em que viviam em Vila Rica será arrasada e<br />

salgada, para que nunca mais no chão se edifiquem [...] e no mesmo chão se<br />

levantará um padrão, pelo qual se conserve em memória a infâmia deste<br />

abominável réu. 158<br />

Sentindo a dor da família estigmatizada, o poeta de Santo Antônio do Monte<br />

escreve os versos de seu poema relatando todo o sofrimento dos filhos do alferes. O sal usado<br />

para o processo da salga, como relata a história, é então visto hiperbolicamente; não se está<br />

mais falando do elemento usado para a salga, mas do “Sal da memória”, isto é, daquilo que<br />

ficou gravado na mente das pobres crianças, dos filhos de Tiradentes. É assim que estas são<br />

vistas lambendo esse sal, que seria, dessa forma, uma maneira de mostrá-las em seu padecer,<br />

tendo que suportar tudo o que fizeram contra eles; uma lembrança que os machucava<br />

(perceba-se a “boca em feridas”).<br />

Rivera se preocupou em detectar os filhos do alferes a sofrerem por dois motivos:<br />

o primeiro, porque não contavam mais com a figura paterna, que era também o herói (décimo<br />

sexto verso); e o segundo, porque não mais possuíam os bens de outrora, quer dizer, estavam<br />

financeiramente arrasados, como se atesta nos quatro últimos versos da quarta estrofe, que<br />

trazem esta “língua da fome”, evidenciando a situação paupérrima em que provavelmente se<br />

encontravam.<br />

O ato de lamber “com os olhos e a testa”, presente na penúltima estrofe<br />

selecionada, seria mais que uma simples sinestesia de que se valeu o poeta para escrever sobre<br />

o referido tema; ele mostra justamente que este lamber não fora dado verdadeiramente pelo<br />

órgão que desempenha esta função (a língua), uma vez que o sal é mais que o elemento<br />

salobro (é ele o padecimento). É assim que o lamber é dado com os olhos, pois são estes os<br />

órgãos que viram a injustiça cometida, e com a testa, que poderia ser a representação da<br />

memória, evidenciando aí a persistência dos fatos decorridos na lembrança tanto dos seus<br />

descendentes quanto de toda a população brasileira.<br />

A última estrofe do poema é belíssima, contando com várias associações que,<br />

mesmo sem muitas ligações entre si, aproximam-se por um bem elaborado processo<br />

estilístico. Vejamos, por exemplo, que a “sede” de que o eu lírico se refere tem como<br />

sinônimo “vontade”, “desejo”; e a “sede”, que denotativamente indica a vontade fisiológica<br />

158 CHIAVE<strong>NA</strong>TO, Júlio José. As várias faces da inconfidência mineira. p. 72

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