O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
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desse elemento, a água, advindas, como o “peixe” e o “afogado”, principalmente. Em relação<br />
a esse aspecto, seria interessante observarmos um fato buscado pela crítica na biografia do<br />
autor para justificar o seu ato de ter o elemento água como um Leitmotiv de sua poesia. Isso<br />
porque, entendendo primeiramente o que o poeta passou em vida, as experiências que teve,<br />
fica mais fácil deduzirmos os processos de que ele se utilizou para realizar o seu fazer poético.<br />
Apesar de não muito sabermos sobre a vida do autor, tendo sua fortuna crítica mais a<br />
preocupação com a obra do que com as suas vivências, temos de qualquer forma o<br />
depoimento de Dulce Salles Cunha Braga, que apresentando em seu livro Autores<br />
contemporâneos brasileiros a latência da água na poesia de Bueno de Rivera, explica o<br />
porquê dessa temática:<br />
As obsessões-chave de Bueno de Rivera são: água e ânsia de afogado. Contou o<br />
poeta mineiro a Paulo Bonfim que, quando menino, caiu em um rio e sentiu-se<br />
morrer. Em segundos, reviu toda a sua curta vida, sofreu desesperos grandes. Até<br />
que a mão forte de um tio o retirou dali. A impressão, porém, veio junto. E forte.<br />
Mas, a meu ver, não é ela, pura, que aparece nos versos. Surge num plano<br />
inteiramente outro. É a ânsia de alguém que se sente afogar por estar mergulhado<br />
na dor desse lodaçal humano, desse mundo pântano. 96<br />
Um excelente exemplo de poema a ser citado seria o “Canto do Afogado”, espécie<br />
de confissão desse eu lírico que muitas vezes se apresenta em Mundo submerso e Luz do<br />
pântano. Analisemos na íntegra, pois, o referido poema, para que a partir dele possamos<br />
realizar nossas conjecturas:<br />
O que fui, as águas não devolvem.<br />
No sumidouro me perdi.<br />
Os amigos procuram um corpo entre as sarças.<br />
Trazem roupas de banho, redes novas,<br />
escafandros no bolso. Eles não sabem<br />
que o afogado sonha entre as anêmonas.<br />
O pássaro entre os caminhos do mar,<br />
o galo da manhã conhece a estrela,<br />
mas vós, amigos, ignorais a face<br />
imóvel sob as águas.<br />
Ó cordeiros da infância,<br />
no olho do peixe está a origem. (LP, p. 11-2)<br />
De todos os poemas de Rivera, este se nos apresenta como um dos mais<br />
herméticos, contando com situações e elementos que não nos permitem compreendê-lo na<br />
96 BRAGA, Dulce Salles Cunha. Autores contemporâneos brasileiros. p. 287<br />
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