O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
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Quando minha irmã morreu,<br />
(Devia ter sido assim)<br />
Um anjo moreno, violento e bom<br />
- brasileiro<br />
Veio ficar ao pé de mim.<br />
O meu anjo da guarda sorriu<br />
E voltou para junto do Senhor 49<br />
Em Rivera encontramos em muitos casos essa vertente intimista, apresentando<br />
sempre uma melancolia incurável. Em seus dois primeiros livros de poesia essa tendência<br />
aparece claramente, seja falando sobre si mesmo, seja sobre a humanidade como um todo, ou<br />
mesmo sobre algum parente ou amigo. Seja como for, Rivera parece querer mostrar, quando<br />
coloca suas dores íntimas nos poemas, a tristeza geral dos seres humanos, como se esta fosse<br />
latente na vida destes, um mal sem remédio, um inevitável sentimento que acomete a todos os<br />
seres viventes.<br />
Muitos são os poemas em que podemos encontrar essa característica, mais<br />
acentuadamente em uns, menos em outros. Restringimo-nos, aqui, a citar o triste “Poema<br />
Simples para o Órfão” – poema em que ficamos face ao sentimentalismo exacerbado do<br />
artista:<br />
Chora. A tua mãe levou nos olhos mortos<br />
a tua madrugada.<br />
Sentirás a saudade do carinho perdido<br />
e olharás com tristeza o crepúsculo<br />
sobre o mundo vazio.<br />
Tua mãe é a tua infância,<br />
não volta mais. (MS, p. 67)<br />
O poeta mineiro cria um poema sentimental, como em muitos casos também se<br />
observa em Bandeira, de uma suavidade e frescor perceptíveis, capazes de despertar os nossos<br />
sentidos para aquele fato ali retratado. Tanto em “O Anjo da Guarda” como em “Poema<br />
Simples para o Órfão” observamos a presença do etéreo, do místico, em um momento de<br />
individualismo artístico, visto as sensações por cada um apresentadas. No primeiro caso,<br />
temos o pensamento na irmã morta e a subjetivação daí advinda (perceba-se o “Devia ter sido<br />
assim”, grifo nosso), contando assim com o transcendental, pois somente em um outro<br />
mundo, metafísico, sua irmã poderia ainda estar viva; no segundo caso, temos a tristeza em<br />
virtude de uma perda irreparável, apresentada de forma densa, complexa. Há, entretanto, uma<br />
49 Ibidem. p. 204<br />
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