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O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA

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O eu lírico nos mostra, então, que a vida não é uma peça teatral, onde a cortina<br />

“descesse sobre a tragédia e houvesse aplausos” após tudo decorrido. Ele “registra o protesto,<br />

a palavra de fel, o amargo estertor coletivo”, considerando-se assim um homem-sismógrafo,<br />

que estampa em todo o seu ser as “imagens cruéis” acontecidas no mundo. Homem triste,<br />

depreende a angústia e o sofrimento dos seus semelhantes, façam parte de seu convívio, como<br />

quando autobiograficamente profere: “O pai chorando, a mãe morta, as cinco irmãs/ sob a<br />

face do pranto” (LP, p. 57), ou não, como em “O Menino Chinês”, em que o poeta se comove<br />

com a dor de uma criança por ele nunca vista: “Menino chinês, nós te ouvimos o apelo,/ nós<br />

te sentimos próximo!” (MS, p. 61).<br />

Os últimos versos do trecho escolhido mostram a forte impressão deixada por tais<br />

fatos na mente do eu lírico: uma mistura de sentimentos tristes e angustiantes, passados para o<br />

poema sob formas simbólicas desconexas, provavelmente da mesma forma como tais<br />

pensamentos se encontravam em sua alma sensível: de forma vaga e difusa, perturbando-lhe<br />

os sentidos. São figuras que remetem a incêndios, dores carnais, sangue e tragédia; mas<br />

parece que o verdadeiro intuito do poeta era o de fazer uma reflexão acerca da atitude do ser<br />

humano frente às inúmeras tragédias da vida.<br />

Rivera nos dá, em “Sismógrafo”, um eu lírico que se confronta com os demais<br />

seres humanos; ele é alguém ciente das dores universais e indagador da sua atitude como<br />

homem que sofre com a dor alheia. Além da preocupação com o outro, o poeta apresenta uma<br />

preocupação consigo mesmo, dado o questionamento que este faz sobre seu modo de ser,<br />

sobre sua inquietação diante do sofrimento mundial. Essa atitude pelo eu poético vivenciada<br />

é, na concepção heideggeriana, o que faz o Dasein, quer dizer, o ser-aí, atingir a sua própria<br />

transcendência, como mostram as palavras de Gianni Vattimo:<br />

Enquanto este projecto que abre e institui o mundo como totalidade dos<br />

entes, o Dasein não está «no meio» dos entes como um ente entre os outros; quando<br />

nota este facto – e, como podemos dizer agora, quando nota a sua própria<br />

transcendência – sente-se num ambiente «estranho», alheio no mundo, em que não<br />

se sente como em sua casa, porque nota justamente que não é um ente no mundo<br />

como os outros. 74<br />

A preocupação com o ser humano é, pois, o ponto de partida da poesia de Rivera,<br />

onde “não está refletida propriamente a angústia pessoal, mas tudo o que pode existir de<br />

trágico no coração do homem”. 75 É assim que ele se refere ao homem em “Meditação no<br />

74 Ibidem, p. 70-1<br />

75 OLIVEIRA, Martins de. História da literatura mineira. p. 365<br />

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