O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA
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O homem seria, ao final das contas, “Sangue” – elemento que poderia gerar duas<br />
conotações: uma, dando a este elemento o sentido de vida, força, robustez; a outra, o sentido<br />
de labuta, dor, sofrimento. E parece-nos que essa era realmente a intenção de Rivera: a de<br />
deixar-nos indecisos quanto ao verdadeiro sentido do vocábulo no verso e quanto ao que ele<br />
queria expor sobre o homem, para logo em seguida, afirmando estar o sangue “com fel”,<br />
mostrar-nos que o vital no ser humano está sempre ligado ao que é amargo, ao padecimento.<br />
A questão do ser humano seria, pois, o principal alvo de Bueno de Rivera, em se<br />
tratando do fator literário, que tenta, através de seus poemas, lançar as mais diversas<br />
indagações a respeito da essência do homem, e com isso, transcender a mera realidade<br />
existencial e desembocar numa macro-compreensão do ser em toda a sua plenitude. Voltamos<br />
então à questão filosófica tratada, já que para essa o ser humano busca sempre o entendimento<br />
sobre o seu próprio ser, para que o compreendendo possa também transcendê-lo. Para<br />
Heidegger, “transcendência significa ultrapassagem”, 76 e esse ultrapassar tem a ver com<br />
querer exercer todas as suas possibilidades de ser humano, querer usufruir de toda a sua<br />
potencialidade. Chega-se, assim, a uma visão aprofundada sobre a questão do ser, pois, para o<br />
mesmo filósofo, “se se escolhe, para o ente que sempre nós mesmos somos e que<br />
compreendemos como ‘ser-aí’, a expressão ‘sujeito’, então a transcendência designa a<br />
essência do sujeito”. 77 Através das indagações sobre o ser humano, Rivera possibilita que o<br />
homem transcenda a si próprio, já que adquirindo maior conhecimento sobre o ser, ele é capaz<br />
de compreender a sua própria essência.<br />
Dignos de consideráveis especulações filosóficas, muitos dos poemas de Bueno de<br />
Rivera colocam o homem comum, o trabalhador assalariado, o transeunte, o ser com suas<br />
necessidades materiais tête a tête com uma gama de questionamentos sobre a sua essência,<br />
como acontece em “Usina Capciosa”, que sem uma análise profunda, poderia parecer simples<br />
brincadeira de um poeta que quer colocar seus leitores diante de meras intrigas, realizando<br />
para isso, artisticamente, trocadilhos diversos; mas na verdade, é justamente nessa forma<br />
artística que jaz todo o mistério do poema, e que será por nós perquirido. Vejamos, portanto, o<br />
poema na íntegra:<br />
Quem possui mais têmpera?<br />
O homem ou o aço?<br />
Melhor fundir o ferro<br />
ou refundir o homem?<br />
76 HEI<strong>DE</strong>GGER, Martin. Vida e obra. p. 104<br />
77 Ibidem, p. 10<br />
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