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O EU ÍNTIMO E O EU SOCIAL NA POESIA DE BUENO DE RIVERA

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Comparando Ângela ao que tem de mais belo e sublime, ela será retratada como<br />

uma flor; é assim que os seus pés aparecem florescendo, no quinto verso de “Itinerário de<br />

Ângela”. Ela também é chamada de “flor do enigma” (sexto verso), e quando é feita a<br />

referência sobre a viagem marítima de Ângela, temos a representação das “pétalas” e do<br />

“caule”, estando o segundo sobre o mar, quer dizer, viajando sob as águas.<br />

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Voltando ao poema em análise, percebemos que a partir da segunda estrofe temos<br />

uma volta ao nascimento de Ângela, que, pela pureza e inocência da puerilidade, é comparada<br />

desta vez a um lírio. A terceira estrofe inicia como se o eu lírico estivesse ali presente,<br />

observando os gestos da garota, a sua ida para a escola; percebemos, no segundo verso da<br />

referida estrofe, que a voz do poema, que no caso seria o próprio Rivera, na verdade<br />

imaginava toda aquela situação a partir de fotografias. É o que deixa evidente o “Duas<br />

tranças/ e a fita como um pássaro voando no retrato”. Os três últimos versos da terceira<br />

estrofe apresentam uma construção interessante: continuando a retratação do que se vê na<br />

fotografia (“neve”, “rosto”, “árvores”), o eu lírico cita também os brinquedos de Ângela,<br />

objetos que possivelmente prendiam a sua atenção quando recordava a sua infância, pois<br />

aqueles aparecem “nevando na memória”. E essa forma de citar os brinquedos, através de um<br />

silogismo ideológico, é poeticamente atingida porque ao lembrar-se daqueles, também o lugar<br />

de origem de Ângela era lembrado; esse lugar de “neve nos telhados”.<br />

Sempre com idas e vindas, “Itinerário de Ângela” mostra cenas de quando a<br />

esposa de Rivera era criança e outras em que ela relembra seu passado, ficando sempre<br />

ambígua a questão do espaço em que as ações se desenrolam: se de fato lá na Rússia, em seu<br />

transcurso, ou aqui no Brasil, apenas na mente dela. É assim que a quarta estrofe inicia-se<br />

como se as cenas se passassem lá, mas na verdade Ângela tão somente rememora (note-se a<br />

expressão “a face vogando no outro lado do mundo”, indicando a lembrança) os<br />

acontecimentos passados.<br />

Na quinta estrofe, novamente as ações se passam “na profunda Rússia”, estando a<br />

cidade de Mariâmpolis distante – na verdade até aquele momento desconhecida por ela; talvez<br />

por isso apareça a cidade “dormindo”. Os dois últimos versos do poema profetizam o que<br />

havia de acontecer: o encontro de Ângela e Bueno de Rivera, que no poema é encarado como<br />

o “afogado”. Eis aí mais um motivo para atestar o caráter autobiográfico de vários dos<br />

poemas de Rivera, que chega, algumas vezes, a inserir-se tanto a si mesmo quanto outras<br />

pessoas mais próximas a ele. Em “Ângela no Porto de Santos” temos mais uma vez uma<br />

alusão ao “afogado”, quando termina o poema com a canção do imigrante:

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