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Direito à Memória e à Verdade - DHnet

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COMISSÃO ESPECIAL SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOSNuma viagem a Buriti, Zequinha levou para São Paulo o irmão Olderico. Em 1969, estava de volta ao sertão baiano, ao lado da mãe em seuleito de morte. Nessa época, militava na VPR. Depois deslocou-se para o Rio de Janeiro e voltou à Bahia, onde passou a militar no MR-8,junto com o irmão Olderico. Com a chegada de Lamarca ao Estado, foi designado para acompanhá-lo e com ele ficou até a morte.Para fundamentar o processo de Lamarca, foi requerido que a CEMDP providenciasse exumação e exame dos seus restos mortais. O pedidofoi negado e a exumação foi garantida pela família. Marcada a sessão da Comissão Especial para julgamento conjunto com o processoreferente a Carlos Marighella, houve novos pedidos de vistas de ambos os processos.Conforme já relatado neste livro-relatório, em 28/08/1971, os agentes da chamada Operação Pajuçara sob o comando do DOI-CODI da 6ªRegião Militar, invadiram o povoado de Buriti Cristalino, município de Brotas de Macaúbas, região do Médio São Francisco. Na casa de Zequinha,mataram um de seus irmãos, Otoniel, e feriram Olderico. Seu pai, José de Araújo Barreto, de 65 anos, foi torturado durante dias.Zequinha e Lamarca ouviram os tiros de Buriti Cristalino, desmontaram a barraca de campanha no sertão e fugiram para dentro da caatinga.Caminharam durante vários dias cerca de 300 quilômetros, em fuga. Fracos e doentes, procuraram ajuda e alimentação em casas isoladas de sertanejoslocais. Zequinha foi visto pelos moradores carregando nos ombros o capitão Lamarca, que estava doente. Como não foram localizados, noinício de setembro a Operação Pajuçara se desmobilizou. Ao invés de 215 homens, permaneceram apenas alguns agentes, chefiados por Nilton deAlbuquerque Cerqueira. Em meados de setembro, recuperada a pista dos guerrilheiros, eles retornaram em peso ao local.Lamarca e José Campos Barreto foram encontrados descansando sob uma árvore, na região conhecida como Pintada. Estavam fracos,desidratados, doentes e sem força, devido à caminhada de muitos dias na caatinga e sem alimentação. Segundo o relatório da OperaçãoPajuçara, “foi fácil e rápido exterminá-los: Zequinha despertou com o barulho da aproximação dos agentes e acordou Lamarca. Tentou correr,mas foi metralhado por um soldado, gritando, antes de cair morto: ‘Abaixo a ditadura’! Os agentes estabeleceram um pequeno diálogo comLamarca, já ferido, e logo também o executaram com rajadas”. O objetivo da operação fora cumprido, sem que o relatório contenha qualquerdescrição de resistência ou combate por parte de Barreto ou Lamarca.Os corpos foram levados para Brotas de Macaúbas e jogados no campo de futebol da cidade para apreciação da população. Os agentescomemoraram, dando rajadas para o alto, gritando vitória e chutando os corpos. Depois, os cadáveres foram colocados em um helicópteroe transportados para Salvador. A família ainda tentou localizar o corpo de José Campos Barreto, mas ficou sem qualquer informação sobreo local onde poderia estar enterrado. Jamais conseguiu seu atestado de óbito.A ordem para a Operação Pajuçara assim foi escrita e assinada pelo então major chefe da 2ª Seção do EMR/6, Nilton de Albuquerque Cerqueira:“localizar, identificar, capturar ou destruir o bando terrorista que atua na região de Brotas de Macaúbas. Para isso: 1. Numa 1ª faseintensificará a busca de informes. 2. Numa 2ª fase, após localizar e identificar o bando terrorista, isolará e investirá à área de treinamentopara capturá-lo ou destruí-lo”.Em nenhuma das 101 páginas do relatório é mencionada qualquer reação armada dos dois mortos. Mas o texto refere-se “ao estado físicoem que se apresentavam os dois terroristas ao final da ação totalmente esgotados(...)”. Nenhuma foto da operação acompanha o relatório.Por isso, na tramitação do processo junto à CEMDP, levantou-se o questionamento: “Por que não preservar, documentar, imortalizar tamanhafaçanha, a de ter atingido mortalmente o lendário capitão Lamarca, mais do que exímio atirador, arma na mão, morto em tiroteio? Porque não preservar para a história o momento exato em que foi abatido o grande mito?” Até mesmo os jornalistas que cobriram o fato foramimpedidos de fotografar o corpo. Genésio Nunes Araújo, policial na época, garantiu em seu testemunho não ter ocorrido reação armada. Elecarregou o corpo dos dois guerrilheiros abatidos e lembra: “os próprios soldados contavam isso com orgulho”.Peça importante para a reconstrução dos fatos foi o álbum com fotos de Lamarca morto, entregue pela Polícia Federal ao ministro da JustiçaNelson Jobim, após intensa busca e pressão da mídia. Com base nesse registro, decidiu-se por exumar o corpo do guerrilheiro.| 181 |

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