Lendas do mundo emerso - O destino de Adhara - Multi Download
Lendas do mundo emerso - O destino de Adhara - Multi Download
Lendas do mundo emerso - O destino de Adhara - Multi Download
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Ou há um lugar <strong>de</strong> on<strong>de</strong> nos veem, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m cuidar <strong>de</strong> nós?<br />
Mais perguntas, pesadas como pedregulhos.<br />
E também havia Amina, que <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> aconteci<strong>do</strong> se apegara a ela <strong>de</strong> forma obsessiva.<br />
Procurava-a o tempo to<strong>do</strong>. Não queria ficar com mais ninguém, e disfarçava a sua inquietação, a<br />
sua incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar a morte, atrás daquele contínuo voltar ao dia em que tu<strong>do</strong> acontecera.<br />
E <strong>Adhara</strong> ficava perto <strong>de</strong>la fazen<strong>do</strong> o possível, pois muitas vezes ajudar os outros também é uma<br />
maneira <strong>de</strong> ajudar a nós mesmos.<br />
Mas <strong>de</strong> quem mais sentia falta era <strong>de</strong> Amhal. O jovem simplesmente <strong>de</strong>saparecera. Tinha<br />
fica<strong>do</strong> tranca<strong>do</strong> na sala com Mira durante a noite inteira. Só saíra <strong>de</strong> lá na manhã seguinte, sem<br />
falar com ninguém, nem com ela. Trancafiara-se na Aca<strong>de</strong>mia, só passan<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu quarto para a<br />
sala <strong>de</strong> treinamento. Só voltara a aparecer uma única vez, no dia <strong>do</strong> funeral <strong>do</strong> mestre.<br />
Era uma manhã ensolarada, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> vários dias <strong>de</strong> chuva. O outono estava chegan<strong>do</strong>, e o ar<br />
sabia a folhas secas e ma<strong>de</strong>ira.<br />
As exéquias aconteceram na gran<strong>de</strong> esplanada on<strong>de</strong> Amhal, <strong>Adhara</strong> e Mira pousaram somente<br />
três meses antes. Havia muita gente. A família real, uma boa parte <strong>do</strong>s Cavaleiros <strong>de</strong> Dragão,<br />
to<strong>do</strong>s os ca<strong>de</strong>tes da Aca<strong>de</strong>mia e uma porção <strong>de</strong> pessoas comuns. Muitos olhares estavam fixos<br />
nela, embora tivesse ti<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> <strong>de</strong> vestir trajes mo<strong>de</strong>stos, manten<strong>do</strong>-se num canto, atrás <strong>de</strong><br />
um Amhal géli<strong>do</strong> e cala<strong>do</strong>.<br />
Tentou falar com ele, mas, diante da intensida<strong>de</strong> da sua <strong>do</strong>r, <strong>do</strong> seu rosto cansa<strong>do</strong>, <strong>do</strong>s olhos<br />
cava<strong>do</strong>s e incha<strong>do</strong>s, não soube o que dizer. E <strong>de</strong> qualquer maneira ele a ignorava. Olhava para o<br />
vazio diante <strong>de</strong> si e para a pilha <strong>de</strong> troncos sobre a qual o corpo <strong>de</strong> Mira havia si<strong>do</strong> coloca<strong>do</strong>.<br />
Porque era assim que os Cavaleiros <strong>de</strong> Dragão partiam, numa gran<strong>de</strong> fogueira purifica<strong>do</strong>ra que<br />
entregava suas cinzas ao vento.<br />
Ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong>le, San, sério e digno, muito compenetra<strong>do</strong> na participação da <strong>do</strong>r geral. <strong>Adhara</strong><br />
ficou um bom tempo olhan<strong>do</strong> para ele. Tu<strong>do</strong> mudara, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua chegada. Era como se ele<br />
tivesse da<strong>do</strong> a partida a alguma coisa, a eventos que afinal haviam leva<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s para lá, diante<br />
daquela fogueira. Meneou a cabeça: pensamentos bobos, aos quais era melhor não se entregar.<br />
O rei falou, o Supremo General e Neor, também. Milhares <strong>de</strong> palavras jogadas ao vento,<br />
palavras inúteis que nada acrescentavam àquilo que Mira fora.<br />
Depois o cortejo com os archotes. Qualquer um, que assim quisesse, podia atear fogo à<br />
fogueira <strong>do</strong> cavaleiro. Amhal foi o primeiro, silencioso, comedi<strong>do</strong>. Levou a chama e voltou ao<br />
seu lugar, contemplan<strong>do</strong> o fogo que estraçalhava uma parte da sua existência.<br />
<strong>Adhara</strong> também sentiu necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participar daquele ritual. Achava que <strong>de</strong>via alguma<br />
coisa àquele homem.<br />
Voltou para perto <strong>de</strong> Amhal, imóvel como uma estátua, com os olhos secos <strong>de</strong> quem já chorou<br />
todas as lágrimas. Olhou para ele, e mais uma vez não conseguiu falar. Esperou, então, que ele<br />
fosse o primeiro a dizer alguma coisa, mesmo que fosse uma repreensão por não ter si<strong>do</strong> capaz<br />
<strong>de</strong> salvar o seu mestre. Mas Amhal não lhe retribuiu o olhar. <strong>Adhara</strong> segurou sua mão, apertou-a.<br />
Uma mão inerte e gélida. Ele nunca lhe parecera tão distante.<br />
Ainda estavam usan<strong>do</strong> roupas pretas, to<strong>do</strong>s os três. Neor observava a chuva fina que <strong>de</strong>scia<br />
sobre Makrat. O verão acabou, pensou com sofrida tristeza.