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Lendas do mundo emerso - O destino de Adhara - Multi Download

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– Enviarei mais alguém além das linhas inimigas e estabelecerei aqui o meu quartel-general.<br />

Os meus homens são tu<strong>do</strong> que me resta. Neor agora é o rei, e como tal está se portan<strong>do</strong>. Para<br />

mim, chegou a hora <strong>de</strong> voltar às sombras, <strong>de</strong> recomeçar a fazer o que fazia quan<strong>do</strong> moça, antes <strong>de</strong><br />

Learco chegar e mudar tu<strong>do</strong>. Pois a noite é o meu reino, como você bem sabe.<br />

Entreolharam-se por algum tempo, sem nada dizer. Aqueles longos anos <strong>de</strong> paz passa<strong>do</strong>s juntas<br />

haviam torna<strong>do</strong> inúteis as palavras entre elas.<br />

Dubhe levantou-se.<br />

– Preciso <strong>de</strong> uma tenda só para mim. Preciso <strong>de</strong>scansar. A gente se vê amanhã. – E saiu com<br />

suas passadas severas e <strong>de</strong>cididas. Tinha realmente volta<strong>do</strong> a ser a <strong>de</strong> antigamente.<br />

Chovia. A água fustigava as pare<strong>de</strong>s da barraca. As juntas <strong>de</strong> Dubhe <strong>do</strong>íam. O catre e os sons<br />

da noite falavam-lhe <strong>de</strong> um passa<strong>do</strong> remoto, da sua vida <strong>de</strong> antes. Era incrível como o presente<br />

acabava forman<strong>do</strong> uma coisa só, com o passa<strong>do</strong>, como se a existência fosse um enorme círculo<br />

que no fim nada mais fazia a não ser nos levar ao mesmo lugar <strong>de</strong> on<strong>de</strong> havíamos parti<strong>do</strong>. Mas o<br />

peso <strong>do</strong>s anos se fazia sentir. Achou que já não era feita para aquela vida dura, que seu corpo se<br />

havia acostuma<strong>do</strong> ao luxo e ao lazer, e que já não conseguiria <strong>do</strong>rmir no chão, sobre folhas secas,<br />

como fazia quan<strong>do</strong> jovem. E que, principalmente, já não seria capaz <strong>de</strong> <strong>do</strong>rmir sozinha.<br />

Sentia falta <strong>de</strong> um corpo ao seu la<strong>do</strong>, <strong>de</strong> uma respiração suave, só um pouco ofegante. Tinham<br />

passa<strong>do</strong> juntos cinquenta anos, e durante este tempo se haviam acostuma<strong>do</strong> um com o outro.<br />

Dormir sozinha, agora, era quase impossível.<br />

Foi provavelmente por isto que ouviu. Não foram os seus senti<strong>do</strong>s, embota<strong>do</strong>s por <strong>de</strong>masia<strong>do</strong>s<br />

anos <strong>de</strong> paz, nem os hábitos <strong>de</strong> um corpo acostuma<strong>do</strong> com os perigos da batalha. Foi a vigília, a<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>do</strong>rmir <strong>do</strong>s velhos, acossa<strong>do</strong>s pelas lembranças. Um barulho diferente da<br />

chuva que castigava a tenda, um som sur<strong>do</strong>, rápi<strong>do</strong>, que lembrava alguma coisa.<br />

Ficou <strong>de</strong> pé e brandiu a espada. Nunca havia si<strong>do</strong> a sua arma predileta, na verda<strong>de</strong>. O punhal,<br />

ele sim, era uma parte <strong>do</strong> seu corpo, a ponto <strong>de</strong> sempre tê-lo consigo. Tinha aprendi<strong>do</strong> a usar a<br />

espada naqueles anos <strong>de</strong> rainha, pois podia servir, podia acontecer que algum dia ela tivesse <strong>de</strong><br />

li<strong>de</strong>rar um exército. Ao partir <strong>de</strong> Makrat, levara a <strong>de</strong> Learco. Era uma passagem <strong>de</strong> coman<strong>do</strong>, um<br />

mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> carregar consigo uma parte <strong>do</strong> sonho <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>.<br />

A escuridão e a chuva cegaram-na por alguns instantes, mas então um lampejo rasgou as trevas,<br />

lá no fun<strong>do</strong>, on<strong>de</strong> ficavam os <strong>do</strong>entes. Conhecia aquele fogo, o seu cheiro acre. Achou que seu<br />

coração iria parar.<br />

Gritos e confusão. Pessoas que corriam para to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s em busca <strong>de</strong> uma impossível<br />

salvação. E solda<strong>do</strong>s incrédulos, incapazes <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r.<br />

Dubhe levantou os olhos e o viu. Um só, que se torcia no ar, sobressain<strong>do</strong>-se contra o leitoso<br />

céu cheio <strong>de</strong> nuvens. Mas tinha proporções diferentes das <strong>de</strong> um dragão: era mais <strong>de</strong>lga<strong>do</strong>, com o<br />

corpo alonga<strong>do</strong> e flexível, o focinho achata<strong>do</strong>, <strong>de</strong> cobra. Principalmente, não tinha patas<br />

anteriores, mas somente asas enormes. Lembrou imediatamente a viverna <strong>de</strong> San, aquele bicho<br />

que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro momento <strong>de</strong>spertara nela uma estranha inquietação.<br />

Conce<strong>de</strong>u-se somente um momento <strong>de</strong> atônita incredulida<strong>de</strong>, em seguida o grito <strong>de</strong> uma horda<br />

que partia para o ataque sobre o seu acampamento trouxe-a <strong>de</strong> volta à realida<strong>de</strong>.<br />

Nunca tinha chefia<strong>do</strong> um exército, e tampouco se encontrara <strong>de</strong> fato numa situação <strong>de</strong> guerra.

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