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Lendas do mundo emerso - O destino de Adhara - Multi Download

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– Dizem que há um encantamento que protege as muralhas, que não <strong>de</strong>ixa a <strong>do</strong>ença entrar –<br />

contou alguém certa noite, numa pousada em que <strong>Adhara</strong> se hospedara.<br />

Teve vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> falar a verda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> dizer que muito em breve Makrat também sucumbiria, que<br />

ninguém podia resistir ao que estava acontecen<strong>do</strong>. Não <strong>de</strong>moraria para a peste se alastrar por<br />

toda parte. Mas para quê? Aquela vaga esperança era a única coisa que ainda sobrava ao pobre<br />

homem, <strong>de</strong> que adiantaria tirá-la <strong>de</strong>le?<br />

Depois começaram a aparecer os <strong>do</strong>entes. Larga<strong>do</strong>s à beira da estrada. E os corpos. Dos que<br />

não haviam resisti<strong>do</strong>, <strong>do</strong>s que tinham morri<strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> às privações, <strong>do</strong>s que foram ataca<strong>do</strong>s pela<br />

<strong>do</strong>ença enquanto buscavam a salvação.<br />

As pessoas seguiam em frente, procuran<strong>do</strong> evitá-los. Às vezes chegavam homens vestin<strong>do</strong><br />

chamativos trajes roxos, seus rostos marca<strong>do</strong>s por profundas manchas escuras.<br />

– São os Cari<strong>do</strong>sos. Pessoas que tiveram a <strong>do</strong>ença mas que se salvaram. A peste, no entanto,<br />

não per<strong>do</strong>a, e <strong>de</strong>ixa no corpo aquelas marcas pretas – explicou um sujeito enquanto os homens <strong>de</strong><br />

roxo recolhiam os cadáveres. – Cuidam <strong>do</strong>s mortos e <strong>do</strong>s moribun<strong>do</strong>s. Po<strong>de</strong>m fazê-lo: já não<br />

a<strong>do</strong>ecem mais.<br />

<strong>Adhara</strong> forçou-se a aceitar tu<strong>do</strong> aquilo. A pieda<strong>de</strong> não era um luxo ao alcance <strong>de</strong> qualquer um<br />

por aquelas bandas. Tinha <strong>de</strong> seguir em frente, até chegar a Damilar, até encontrar Amhal. E por<br />

isto apren<strong>de</strong>u a ser insensível, a manter a cabeça baixa enquanto <strong>de</strong>ixava léguas e mais léguas<br />

para trás.<br />

Avistou o acampamento na tar<strong>de</strong> <strong>do</strong> quarto dia. Estava esgotada.<br />

Voltara a chover, e o ar estava frio. A base apareceu como um incerto amontoa<strong>do</strong> <strong>de</strong> luzes que<br />

brilhavam trêmulas entre as árvores.<br />

Naquela manhã havia <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong> a estrada principal para a<strong>de</strong>ntrar-se na mata. A Floresta <strong>do</strong><br />

Norte <strong>de</strong>senvolvia-se no sopé <strong>do</strong>s Montes <strong>de</strong> Rondal e era diferente <strong>de</strong> qualquer outro bosque<br />

que ela conhecia. Tinha algo <strong>de</strong> sombrio e arcano, que assustava. Quase todas as árvores eram<br />

coníferas muito altas, retas e escuras, que espalhavam no chão um tapete <strong>de</strong> agulhas mortas que<br />

estalavam sob os pés. Não se ouvia o canto <strong>de</strong> pássaros, só um in<strong>de</strong>fini<strong>do</strong> frufru, como se alguém<br />

a observasse e espionasse os seus passos. Era um silêncio ameaça<strong>do</strong>r, hostil. E fazia frio.<br />

<strong>Adhara</strong> tinha <strong>de</strong> apertar a capa em volta <strong>do</strong> corpo para não <strong>de</strong>ixar o gelo penetrar em seus ossos.<br />

Durante o dia to<strong>do</strong> o caminho fora em aclive, às vezes bastante íngreme, e ela já não tinha força<br />

nas pernas esgotadas. Percorrera o último trecho na mais completa escuridão, só po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> contar<br />

com a fraca luminosida<strong>de</strong> <strong>do</strong> céu e aguçan<strong>do</strong> os olhos para não per<strong>de</strong>r o rumo. E então aquelas<br />

luzes trêmulas, funéreas, que lhe haviam <strong>de</strong>volvi<strong>do</strong> alguma esperança.<br />

Pouco a pouco, o caminho ficou mais largo, apareceram as primeiras tendas improvisadas e um<br />

cerca<strong>do</strong> <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, completamente fecha<strong>do</strong> e vigia<strong>do</strong> por guardas arma<strong>do</strong>s. Lá <strong>de</strong>ntro, gritos e<br />

confusos gemi<strong>do</strong>s. <strong>Adhara</strong> apertou ainda mais a capa em volta <strong>do</strong> corpo.<br />

E agora? Sabe-se lá on<strong>de</strong> Amhal estava. Talvez fosse melhor perguntar. O que ele iria pensar<br />

ao vê-la?<br />

Avançou em silêncio pelo acampamento, acompanhada pelos olhares e comentários hostis das<br />

pessoas que saíam das barracas. Olhou em volta, inquieta. Ainda não estava na zona militar:<br />

aqueles eram retirantes. A palavra “estrangeira” ecoava <strong>de</strong> boca em boca. Tomou coragem e

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