o seu tempo - DSpace CEU

timidade, nada fará na vida do seu Rei; pois nada seria justo. As mais classes da
Nacáo tambem suspiram pelo momento de se verem livres de urna táo grande
oppressáo, e o respeito as contém nos limites do seu dever; porém, apesar de
tudo isto, trabalham para que os malévolos nao impeçam o que deve ser quando
S. M. morra.
De todas as provincias escrevem animados do melhor espirito em favor da
legitimidade, e todos esperamos em Deus que, quando chogar o momento da
morte, nao ha de haver contradiccáo alguma.
O exercito, como mais cheio de vicios, é que nao está todo a nosso favor, porém
contase com grande parte d'elle. Os Guardias teem dado exemplo de maior
amor pelo legitimo herdeiro, e nao socegam, nem de noite nem de dia, para vigilarem
contra as intençoes dos perversos.
Tem havido immensos desafios, entre os offieiaes da Guardia Real; e é urna
cousa que parece milagre que nem um só dos Reaes tem sido ferido, e todos os
chamados cristinos téem levado cutiladas de morte.
E incrivel a festa que toda a gente faz a SS. AA. quando váo a alguma
parte; o que faz ter muitas raivas ao partido contrario.
A R... é perversa e muito capaz de tudo quanto ha mau. Tem feito cousas
peiores a esta Nacáo que todos os constitucionaes puderam fazer no tempo em
que a dominaram: desterros, prisoes, castigos de toda a especie, é o que todos
os dias faz esta pessima mulher. Todos os empregos estao mudados e já nao ha
um só que seja oceupado por realista, e sim o sao todos pelos homens mais diabólicos,
que se pode imaginar.
Emfim, pelas gazetas podes fazer urna pequeña idea; e o estado de perversidade
em que tudo se tem posto, pelo muito mau governo que ha, é inexplicavel.
Porém, apesar de tudo, a justa causa ha de triumphar, pois é causa de Deus.
A R... está desacreditada em toda a Nacáo, e todos fallam d'ella que faz
vergonha fallem assim de urna R ...
Digo-te devoras que nao sei como, no meio de tanta oppressáo e estado de
maldade em que o governo está hoje, haja quem se atreva a fallar do modo que
se falla, pois é tanto, e com tanto descaro, que publicamente dizem todos que nao
querem soffrer italianas, que nao as deixaráo aqui nem um momento depois que
El-Rei morra; váo para Ñapóles comer macarrones, que bastante téem comido
o sangue dos hespanhoes.
Das duas Portuguezas e do Infante, todos fallam bem.
Parece que nao te podes queixar, pois faço-te urna relacáo de tudo o que
aqui passa; ainda que em compendio, porque, se fosse com toda a extensáo, era
preciso muito tempo, e eu tenho táo pouco que para isto mesmo custou-me muito
trabalho.
Esquecia-me dizer-te que S. M. continua a passar bem e que o que te téem dito
de sua molestia nao é certo; ainda que os médicos nao confiam em que se
curará, julgam nao morrerá táo depressa como temeram quando S. M. veiu
da Granja.
É urna pena que este Senhor nao tome o governo, pois se o tomasse nao succe-
deriam cousas táo más. Elle bem conhece tudo; porém, tem tal medo á fera da
sua mulher, que nao se resolve a diser-lh'o, nem a fazel-o. Ella é táo má que elle
treme de a desgostar, pois julga que se a desgosta está perdido; que tal?! As
duas Portuguezas e o I... soffrem muitas desfeitas de SS. MM., porém nao se
dáo por vencidos; antes pelo contrario, mostram a maior firmeza e carácter em
todas as suas acçoes.