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Estela

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Descobriu os braços cuja alvura se iluminou e se coloriu de<br />

suave rosa pelo fulgor da lareira.<br />

Enrodilhada no seu devaneio, só então reparou que, pela primeira<br />

vez, se deitara vestindo em camisa-de-dia, a camisa do<br />

baile, de finas e vaporosas rendas, e notou que jamais se vira<br />

assim tão bela; e essa descoberta não lhe aproximou o sono.<br />

<strong>Estela</strong> era uma jovem recentemente saída de um convento e<br />

ainda muito devota. Refletindo sobre as sensações do baile,<br />

recordou as opiniões severas do seu confessor e as achou acertadas.<br />

Ó valsa! dança voluptuosa e acariciante, despertar da carne na<br />

luz e no movimento, não és (oh! contentamento do ser vivente!)<br />

um primeiro pecado? Não é na dança que o homem e a mulher se<br />

encontram pela primeira vez na vida? Não são aí os nossos<br />

sentidos invadidos de ternura? Os olhos pela beleza das formas,<br />

o ouvido pela música, o olfato por perfumes capitosos, o tato de<br />

todo o corpo pelo ritmo cadenciado que conduz um par em<br />

espirais ondulantes?<br />

A moça a princípio dança pelo prazer de dançar, de movimentar-se,<br />

de sonhar girando, servindo de cavalheiro um condiscípulo<br />

do convento; mas esse prazer se transforma um dia e se<br />

desdobra, quando ela se sente escolhida por sua beleza e se vê<br />

admirada do seu par masculino. E depois, certa noite, o prazer se<br />

transforma ainda, e desta vez em outra sensação inteiramente<br />

nova, que lhe parece indelével: a valsa, ondulante e leve, desfolha<br />

em seu giro as mulheres e as flores.<br />

Na vida tudo é contraste e tudo se assemelha.<br />

As impressões sentidas em suas primeiras noites de vida<br />

mundana estavam certamente bem longe das emoções religiosas<br />

experimentadas nas austeras cerimônias da Igreja; contudo,<br />

nestas todos os seus sentidos haviam sido cativados: a vista, pelo<br />

grandioso estilo gótico que leva o pensamento às alturas e pela<br />

misteriosa luz que filtra dos vitrais; o olfato, pelo perfume do<br />

incenso; a audição, pela penetrante suavidade de certos cânticos<br />

litúrgicos que se casam à melodia misteriosa do órgão; todo o

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