You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
encadernada em pergaminho, que trazia por título: “Os Emblemas<br />
do amor divino e humano reunidos”, publicada em Paris, em<br />
1631, com privilegio dos doutores de Teologia, trazendo em<br />
cada página uma linda figura em talho-doce, representando todos<br />
os sentimentos do amor sob imagens religiosas, sendo cada<br />
figura comentada por uma pequena composição de doze versos.<br />
Olhou maquinalmente essas ingênuas gravuras. De repente, entre<br />
duas folhas, percebeu uma pequena flor fanada. Lembrou-se de<br />
que, por ocasião da penúltima visita de <strong>Estela</strong>, quando, num<br />
arrebatamento, lhe dera o beijo que decidira do seu destino, ela<br />
apanhara um livro da estante em frente. Sim, aquela flor era a da<br />
sua Estrela, não podia ser outra. E beijou ternamente a flor, sem<br />
poder desprendê-la dos lábios.<br />
Era dela a pequenina flor. Ela a tocara e a colocara ali, e nela<br />
o seu pensamento ficara. Pobre <strong>Estela</strong>, tão ternamente, tão apaixonadamente<br />
ficara! Onde estaria? Que seria feito dela? Sim, ela<br />
também o amava. Mas, depois de tantos meses, sabendo que ele<br />
não queria, não podia desposá-la, não se teria ela decidido pelo<br />
duque, ou qualquer outro partido ao agrado da família? Era um<br />
absurdo o que ele fizera! Ela lhe pertencia, e lhe dera sua alma,<br />
seu coração, seu amor. Porque não tomara posse desse todo? Que<br />
estranhos escrúpulos, para ele, o “Solitário”, o desdenhoso de<br />
todas as convenções mundanas, o apóstolo do absoluto. E fora<br />
por excesso de amor que a respeitara! E não tornara a chamá-la!<br />
E a perdera! Que loucura! Revê-la-ia ainda? E para que revê-la,<br />
se não poderia mais ser sua companheira no caminho da vida,<br />
pois que estava condenado a uma solidão eterna? Revê-la, correr<br />
a Paris, chegar à Rua Vaneau, procurar a silhueta da sua sombra<br />
na janela, espreitar sua saída, segui-la, apresentar-se de chofre<br />
diante dela... Não; ela nunca mais lhe escrevera. Esquecera-o. E,<br />
depois, aquela aparição'. Talvez estivesse morta ou agonizante!...<br />
E a frase, que tantas vezes repetira para justificar sua conduta,<br />
voltava-lhe outra vez aos lábios: “Ela crê que me ama, a encantadora<br />
parisiense; imagina poder partilhar da minha vida de<br />
trabalho e o meu deserto; ilude-se; teria sido sua infelicidade.<br />
Agi bem! Agi muito bem!”