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Estela

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que seria melhor abrir uma vala e colocar uma grade de ferro?...<br />

Quer que solte os cavalos? – pois o senhor não estabeleceu hora<br />

de atrelá-los... O arquiteto deseja falar com o senhor a respeito<br />

da nova chaminé... A cozinheira previne a senhora de que é<br />

inadiável mudar de açougueiro... Senhor, não é possível sair com<br />

este chapéu... Senhor, o cocheiro está a cair de bêbado... O<br />

senhor encomendou o feno?... E eu poderia facilmente continuar<br />

essa ladainha, falar dos dias em que madame, cansada das pedincharias<br />

e dos roubos, despede todos os domésticas de uma vez,<br />

ou dos aborrecimentos que ela teve, quando soube que a jardineira<br />

era conhecida em todo o país pela sua conduta escandalosa, e<br />

que o cocheiro e a criada de quarto viviam iguais a marido e<br />

mulher? Esses amos são, pois, cegos e imbecis a ponto de não<br />

perceberem que são roubados por essa gente que os escarnece?<br />

Em que se ocupam eles, senão dos seus interesses e da conduta<br />

dos seus domésticos?<br />

Vejamos caro doutor, como pretendeis que um homem de ciência<br />

trabalhe nessas condições? São preocupações inúteis ao<br />

funcionamento do cérebro, aceitáveis, quando muito, para homens<br />

sem o que fazer ou que se interessam pelas couves e beterrabas.<br />

Quanto mais servos, mais aborrecimentos cotidianos.<br />

Lembrai o provérbio: “A quem terra tem, guerra vem”, e eu não<br />

aprecio a guerra. A tranqüilidade e a independência do espírito<br />

são os primeiros dos bens. Onde encontrareis independência com<br />

riquezas? Nelas vejo apenas escravidão disfarçada. Não se<br />

almoça, nem se janta duas vezes. Então, para que servem? Achareis<br />

esses medíocres detalhes insignificantes, mas a vida se<br />

compõe de detalhes, tal qual a hora se compõe de minutos. Que<br />

direi agora da vida real e fatal do homem e da mulher da sociedade?<br />

Fortuna obriga! As relações, as visitas, os jantares, as<br />

reuniões noturnas, a correspondência epistolar, eis em que minúcias<br />

a minha vida se escoaria! É preciso também dar recepções.<br />

Onde encontrar, fora daí, tempo para trabalhar?<br />

E não falo das intrigas mundanas, nem das vaidades, das<br />

questões de amor-próprio, das ambições que se sucedem. É<br />

preciso ter um lugar no que se denomina mundo, ser pelo menos<br />

de uma das cinco Academias do Instituto; conceder um ou dois

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