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Estela

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Adriana, que lhe estava ao lado, não ocultou seu grande espanto<br />

com as indagações de <strong>Estela</strong>. “A Astronomia – disse – a<br />

quem pode interessar? Aos loucos! Olha, não sei sequer o que<br />

seja a Ursa Maior... Nisso ou naquilo me é indiferente!”<br />

Em outro dia, ouvira uma espécie de profissão de fé feita por<br />

seu noivo a um dos amigos íntimos. Certo artigo da “Revista dos<br />

Dois Mundos”, de autoria de Renan, era objeto de momentânea<br />

discussão e o duque concluíra sua resposta com estas palavras:<br />

“No fim de contas, a verdadeira filosofia está no rir de tudo e de<br />

todos.” – no momento exato em que a jovem sonhadora entrava<br />

no salão. Ouvira apenas essa frase, porém às vezes uma só<br />

palavra ensina mais do que um longo discurso. Nunca sentira<br />

tanto a banalidade da vida mundana, a nulidade das pessoas<br />

desocupadas, o vácuo de suas conversações, a estreiteza do<br />

quadro dentro do qual se movem suas idéias, a pouca extensão<br />

do horizonte habitual desses liliputianos, a grosseria de suas<br />

sensações. Nenhum ideal. Nenhuma grandeza. Cegueira intelectual.<br />

As conversações desses homens e dessas mulheres mostravam<br />

que tomavam grãos de areia por montanhas. Concepções de<br />

formigas. Parecia-lhe, lendo os livros agora seus preferidos, sair<br />

de um calabouço e respirar o ar e a liberdade dos grandes planaltos.<br />

Era realmente um mundo novo que se desdobrava diante<br />

dela.<br />

Como podiam tantos seres inteligentes viver sem exercitar a<br />

inteligência, sem nada aprender, sem outra leitura que a de<br />

frivolidade, sem biblioteca? Era um problema para <strong>Estela</strong>. Notara,<br />

pela primeira vez, que os apartamentos não têm biblioteca,<br />

apesar de entulhados de numerosos móveis inúteis.<br />

Porque seu tio só jurava pelo “Solitário” e recorria sempre<br />

aos seus escritos para a solução de todos os enigmas, <strong>Estela</strong><br />

acabou um dia por lhe dizer:<br />

– Mas, quem é esse “Solitário”? Seus livros são encontrados<br />

em todas as mãos e ninguém jamais o viu. Não reside em Paris?<br />

– Provavelmente não. Nunca ouvi falar da sua pessoa.<br />

– Contudo, deve existir, viver em alguma parte. Nunca se vê<br />

seu retrato, entre os autores contemporâneos, dos quais é, sem

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