Número Especial: FAEEBA 25 anos PPGEduC 10 anos - Uneb
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Novo enfoque dos estudos internacionais<br />
reivindicações de diferença cultural e com frequência<br />
achou difícil distingui-las “em princípio ou<br />
na prática de diferenças ideológicas, diferenças de<br />
gostos ou diferença de opiniões”.<br />
3. Fortes oposições de classe, autoritarismo do<br />
poder e frustração de expectativas sociais ou políticas,<br />
aparecem em vários países como componentes<br />
seculares condutores de conflitos, que se exprimem<br />
pelas vias do tumulto ou da guerra civil.<br />
É um erro ver o tumulto como prática “não civilizada”<br />
de multidões destruidoras. Na verdade, o<br />
tumulto – quer tenha começado de forma espontânea<br />
ou não – tem sido ao longo da História um fator de<br />
grande influência, tanto para o sucesso de revoluções<br />
populares, como para alterações pontuais, como para<br />
fortalecimento de autoritarismos e sectarismos.<br />
Nos <strong>anos</strong> mais recentes, vários autores estudaram<br />
o tumulto, partindo das insurreições estudantis<br />
dos <strong>anos</strong> 60, merecendo destaque o trabalho de Tariq<br />
Ali (2008), “O poder das barricadas” (Boitempo<br />
editorial – São Paulo), onde se abordam também<br />
contextos não-europeus. Trabalhos semelhantes foram<br />
produzidos sobre o mesmo período nos Estados<br />
Unidos, com foco nos movimentos de direitos civis<br />
ou levantes (riots) identitários de protesto urbano.<br />
Tanto no caso da Europa como dos Estados Unidos,<br />
os tumultos tiveram papel primordial na revolução<br />
cultural mundial dos <strong>anos</strong> 60 e 70, que suscitou<br />
alterações irreversíveis e, no caso norte-americano,<br />
abriram caminho para, menos de 50 <strong>anos</strong> depois,<br />
eleger um Presidente mestiço filho de um imigrante<br />
temporário africano.<br />
O tumulto faz parte da tradição européia de<br />
insurreição popular e, embora se tenha acentuado<br />
nos séculos 18 e 19, já muito antes ocorria, de<br />
forma intermitente, no “velho continente” contra<br />
regimes absolutistas, ou seja, na ausência de canais<br />
institucionais de mudança, espalhando-se por<br />
outros continentes ou acrescentando técnicas e<br />
argumentos a praticas sociais pré-existentes (casos<br />
do mundo árabe e Índia, por exemplo).<br />
A dinastia portuguesa, iniciadora do processo<br />
de expansão marítima européia, tomou o poder<br />
projetado por tumultos em Lisboa, durante uma<br />
crise sucessória; o movimento pela independência<br />
dos Estados Unidos começou com tumultos contra<br />
o sistema colonial de impostos; a revolução<br />
francesa teve abertura pratica em tumultos contra<br />
202<br />
a falta de pão. Nos <strong>anos</strong> 90 do século passado, as<br />
Intifadas palestinas reintroduziram o tumulto como<br />
método de atuação, capaz de incidências internacionais,<br />
em função da sensibilidade da região onde<br />
decorreram.<br />
As insurreições dos <strong>anos</strong> 60 foram causadas pela<br />
rigidez das normas culturais, em choque com evolução<br />
de comportamentos que, dos meios universitários<br />
se estenderam a outros setores da geração<br />
situada entre a adolescência e a juventude adulta.<br />
Há, portanto, vários motivos (e áreas de atuação)<br />
para tumulto, mas sua execução implica a mobilização<br />
de multidões sem armas de fogo, a crença<br />
de atingir os objetivos em curto espaço de tempo<br />
e, em geral (mas não sempre) uma correlação de<br />
forças capaz de impedir o poder de fazer massacre.<br />
Os movimentos dos <strong>anos</strong> 60 – estudantis, pacifistas<br />
ou antirracistas – desenrolaram-se num clima com<br />
essas três componentes.<br />
Desde a segunda década do século XIX, o exemplo<br />
histórico mundial com mais constância e mais<br />
áreas de atuação, é a Bolívia, país onde as grandes<br />
mudanças foram sempre precedidas (e acompanhadas)<br />
por tumultos, com grandes mobilizações<br />
sociais e muita eficácia em alcançar os objetivos.<br />
Todo este conjunto de tumultos situa-se no<br />
campo progressista, no sentido de mais participação<br />
popular na esfera pública e de modernização<br />
estrutural. Mas a História registra também outros<br />
dois tipos de tumultos. Os saques motivados<br />
pela pobreza, em todo o mundo e várias épocas,<br />
caracterizaram-se pelo roubo de produtos para<br />
subsistência como fim em si, enquanto que os<br />
“pogroms” do leste europeu visavam eliminar ou<br />
aterrorizar minorias raciais.<br />
América Latina e África foram palco de saques<br />
em décadas recentes. Haiti e países afric<strong>anos</strong> da<br />
região do Sahel, no começo do século XXI, passaram<br />
por movimentos desse tipo contra a brusca<br />
subida de preços dos bens de primeira necessidade.<br />
Mas já antes disso tinha se popularizado o termo<br />
“caracazo”, inspirado em saques de supermercados<br />
na capital venezuelana.<br />
Alguns confrontos na Nigéria, classificados<br />
como inter-comunitários, parecem traduzir vontades<br />
do tipo pogrom, mas o genocídio de Ruanda<br />
ultrapassou em brutalidade tudo quanto se tinha<br />
visto na matéria.<br />
Revista da <strong>FAEEBA</strong> – Educação e Contemporaneidade, Salvador, número especial, p. 197-204, jul./dez. 2009<br />
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