Número Especial: FAEEBA 25 anos PPGEduC 10 anos - Uneb
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A pedagogia de Manuel Tranquillino Bastos<br />
220<br />
É um verdadeiro apóstolo na sua profissão, de uma<br />
instrução variada e accessível a todos os cometimentos<br />
grandiosos. (QUERINO, 1909, p. 207)<br />
Manuel Tranquillino Bastos nasceu na Rua do<br />
Pasto na cidade de Cachoeira-Bahia no dia 08 de<br />
outubro de 1850 e faleceu em sua casa na Praça<br />
“Maestro Tranquillino Bastos”, nesta mesma cidade,<br />
no dia 12 de março de 1935. De acordo com<br />
Jorge Ramos, Tranquillino nasceu da união de um<br />
português com uma negra alforriada e, ainda menino,<br />
aprendeu a tocar clarineta e se incorporou ao<br />
Coro de Santa Cecília, a padroeira dos músicos e,<br />
mais tarde, à Banda Marcial São Benedito, formada<br />
basicamente por músicos negros. (A Tarde-Cultural<br />
[Salvador-Ba], 07 de outubro de 2000 citado por<br />
SANTOS FILHO, 2003). Assim, sua formação<br />
musical foi tecida a partir da cultura musical do<br />
Brasil de sua época, em particular de Cachoeira,<br />
sua terra natal, em diálogos com as culturas italiana,<br />
francesa, alemã, portuguesa e espanhola de seu<br />
tempo, através do estudo de obras, mas principalmente<br />
das duas primeiras. A marca da ópera na<br />
música deste Mestre, e de muitos outros Mestres de<br />
Banda, é bastante presente e pode ser identificada<br />
em suas obras.<br />
Tranquillino Bastos esteve sempre à frente dos<br />
movimentos sociais e políticos de Cachoeira, sua<br />
cidade natal e de seu país. Isso pode ser verificado<br />
através de algumas de suas obras como o “Hymno<br />
Abolicionista” (1884), “Hymno 13 de Maio”<br />
(1888), “Hymno da Cachoeira” (1922), o “Dobrado<br />
Navio Negreiro”, homônimo do poema de Castro<br />
Alves, seu contemporâneo que também foi abolicionista,<br />
assim como o grande compositor paulista<br />
Carlos Gomes. Essas obras eram compostas como<br />
forma de protesto e repúdio à escravidão.<br />
Além de sua produção musical, em escritos<br />
Tranquillino descreve de forma sucinta e acurada<br />
as suas experiências, realizações, a maneira autodidata<br />
de aquisição dos conhecimentos e habilidades<br />
musicais, os empreendimentos na fundação e<br />
organização de bandas e sociedades civis. Através<br />
deles, expressava sua visão de mundo em forma<br />
de crônicas, que versavam ainda sobre assuntos<br />
diversos como arte, religião, cultura, vida, morte,<br />
comportamento social, música, e vários outros temas<br />
humanísticos. Essas crônicas eram publicadas<br />
numa coluna dominical denominada de “Cartas<br />
Musicaes” no semanário “O Pequeno Jornal”, de<br />
1924 até sua morte, em 1935, e que circulava em<br />
Cachoeira. Tais crônicas foram arroladas por Tranquillino<br />
em um livro, não publicado e intitulado<br />
“Minhas percepções”.<br />
A análise do pensamento de Manuel Tranquillino<br />
Bastos, expresso no conteúdo de seu livro<br />
inédito Minhas percepções aponta nas seguintes<br />
direções:<br />
• O livro, coletânea de pequenos textos, foi escrito<br />
na maturidade de seu autor e dedicado ao<br />
filho para lhe transmitir suas “aprendizagens”.<br />
Segundo o autor, no prefácio, suas percepções<br />
“são produto de acuradíssimas observações pacientes<br />
e cuidadosamente colhidas no reino da<br />
sociedade da moda atual, no que ela foi, no que<br />
é e no que será”. Tendo em vista sua declaração<br />
de que deseja reservar exclusivamente para seus<br />
olhos as linhas do livro, deduz-se que não tinha<br />
a intenção de publicá-las. Justifica esta decisão<br />
com sua intenção de não ferir susceptibilidades<br />
alheias.<br />
• Não se caracteriza como uma autobiografia<br />
– porque não fala sobre sua própria vida –,<br />
mas traz uma série de elementos que ajudam a<br />
mostrar a consciência que constrói sobre o seu<br />
trabalho e o seu estar no mundo, em Cachoeira,<br />
Recôncavo da Bahia, no final da década de 20<br />
e início dos <strong>anos</strong> 30 do século XX. Nascido em<br />
1850, Manuel Tranquilino Bastos estaria, com<br />
mais de 75 <strong>anos</strong> naquele momento, no período<br />
entre as guerras mundiais de crescimento do<br />
movimento popular de crítica à República Velha<br />
e ao sistema eleitoral brasileiro (a bico de<br />
pena, como se dizia), muito sujeito a fraudes<br />
e dependente da presença dos “coronéis”. Período<br />
também do crescimento da influência do<br />
capitalismo industrial, marcado pela mudança<br />
nos costumes pela adoção do “american way of<br />
life”, difundido pelo cinema, pela introdução de<br />
novas formas musicais, danças, mudanças nas<br />
relações entre os sexos, pelo enriquecimento via<br />
capitalismo que culmina na crise de 1929, com<br />
consequências no Brasil, fortalecendo a movimento<br />
que desemboca na Revolução de 30.<br />
• Todos estes aspectos do que chama de “moda<br />
atual” estão registrados nos textos de Manuel<br />
Revista da <strong>FAEEBA</strong> – Educação e Contemporaneidade, Salvador, número especial, p. 213-228, jul./dez. 2009<br />
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