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Margarida Alves - Ministério do Desenvolvimento Agrário

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n e a D e S p e C i a l<br />

O lugar da sexualidade, naquele contexto camponês, não seria no quarto da<br />

casa, ou não exclusivamente ele, mas a roça – para a surpresa <strong>do</strong>s investiga<strong>do</strong>res.<br />

Nestes termos, o processo de trabalho não apenas evoca a sexualidade, com seus<br />

ritos de passagem, mas a ele se associa estreitamente.<br />

É após a iniciação sexual em que o filho passaria a ajudar o pai na derruba e<br />

na queimada, isto é, no enfrentamento com a “natureza perigosa,” com o mato.<br />

Neste senti<strong>do</strong>, há uma relação simbólica no discurso <strong>do</strong>s camponeses, pauta<strong>do</strong><br />

em uma identidade coletiva/masculina, entre mulher e mato.<br />

Assim, o processo de trabalho inicia também a simbolização <strong>do</strong> espaço, ou a<br />

“culturalização” da natureza. Segun<strong>do</strong> os autores, as mulheres camponesas, por<br />

exemplo, só teriam acesso ao mato depois que este foi amansa<strong>do</strong>, isto é, depois<br />

que a natureza foi <strong>do</strong>mesticada, pois “…essa <strong>do</strong>mesticação é feita pelo trabalho,<br />

o “opera<strong>do</strong>r” da passagem da natureza para a cultura, que também “<strong>do</strong>mestica”<br />

outra dimensão natural, transforman<strong>do</strong> sexo em gênero…” (Woortmann ;<br />

Woortmann, 1997, p. 136).<br />

Para Woortmann; Woortmann são concepções classificatórias que demarcariam<br />

espaços de gênero, cujas fronteiras não deveriam ser transgredidas, para<br />

que sejam mantidas as fronteiras sociais. Portanto, a construção <strong>do</strong>s espaços de<br />

gênero faz-se ainda pelo uso simbólico <strong>do</strong>s instrumentos de trabalho.<br />

Em Da complementaridade à dependência, Ellen Woortmann (1991) aponta<br />

para a ordem <strong>do</strong> discurso público <strong>do</strong> grupo estuda<strong>do</strong>, no caso <strong>do</strong>s universos camponeses<br />

pauta<strong>do</strong>s em sua maioria no pátrio poder que configura um <strong>do</strong>s pontos da<br />

campesinidade e que se replica no discurso <strong>do</strong> pesquisa<strong>do</strong>r, tais discursos corroborariam<br />

para uma política de gênero, freqüentemente legitimada pelos discursos<br />

acadêmicos. Para Woortmann, “…a classificação <strong>do</strong> espaço depende <strong>do</strong> contexto<br />

em que se produz o discurso…” (Woortmann, 1991, p. 3).<br />

Ao abordar a complementaridade entre os gêneros na constituição da dieta<br />

familiar entre comunidades pesqueiras no Rio Grande <strong>do</strong> Norte, Woortmann<br />

ressalta que havia entre os gêneros uma complementaridade qualitativa na constituição<br />

desta dieta. A produção feminina se caracterizaria ainda pela constância<br />

e pela reposição previsível. Por outro la<strong>do</strong>, era o trabalho feminino de salga e<br />

secagem <strong>do</strong> pesca<strong>do</strong>, por ocasião da safra, que garantia seu consumo por perío<strong>do</strong><br />

relativamente longo, bem como sua comercialização.<br />

Dessa maneira, as relações internas à família e à comunidade nesses povoa<strong>do</strong>s<br />

se caracterizavam pela complementaridade entre os gêneros, embora tanto<br />

a família quanto a comunidade, fossem organizações hierárquicas, no plano<br />

ideológico, as transformações ecológico-sociais que atingem a terra afetam diretamente<br />

as mulheres. Segun<strong>do</strong> Ellen Woortmann, outras transformações, relativas<br />

ao mar, atingem os homens, e seus efeitos se projetam sobre as mulheres.

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