Margarida Alves - Ministério do Desenvolvimento Agrário
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n e a D e S p e C i a l<br />
Essa fala introduz a participação na Associação como um espaço hierarquiza<strong>do</strong>.<br />
Diego, e depois outros “jovens,” apontaram que não há interesse na participação<br />
cotidiana <strong>do</strong>s jovens. Outro relato, o de Jaqueline, reforça a percepção dessas<br />
relações de hierarquia. Ela lembrou de um episódio onde diante de uma pergunta<br />
que fez sobre dívida de crédito <strong>do</strong> Programa Especial de Crédito para a Reforma<br />
Agrária (Procera), os adultos riram.<br />
E – Mas antes, quan<strong>do</strong> você era <strong>do</strong> Mutirão, se você desse um palpite, as pessoas ouviam?<br />
Jaqueline – Eles não dão muita trela pros jovens não sabe. A gente não tinha muita<br />
voz ativa não. Era assim, eles queria a gente pra votar, mas pra falar alguma coisa não.<br />
E – Eles reclamam que vocês não participavam.<br />
Jaqueline– E quan<strong>do</strong> a gente participava eles não deixavam fazer nada. […] Eu lem-<br />
bro que uma vez, […] eu já tinha casa<strong>do</strong>, teve uma reunião pra falar sobre negócio de<br />
pagamento <strong>do</strong> Procera […]. Então escutan<strong>do</strong> ali a conversa eu falei assim, perguntei se eu<br />
podia falar. “Vem cá uma pessoa quan<strong>do</strong> morre, a dívida morre ou a família tem que…?”<br />
[…] Uma pergunta que eu acho que interessava a to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>. […] Aí riram de mim,<br />
riram de mim. […] O pessoal que estava na reunião, riram de mim. […] Então quer dizer<br />
muitas das vezes era isso que acontecia, a gente falava alguma coisa…<br />
Nesse mesmo relato Jaqueline classificou como jovem, Dália – a ex-presidente<br />
da APPME com que tínhamos trava<strong>do</strong> contato no início <strong>do</strong> trabalho de campo.<br />
Apesar da resistência à participação <strong>do</strong>s “jovens,” uma “jovem” Claudinha<br />
(27 anos) integrou como secretária, a chapa da direção, cujo presidente foi o Eder.<br />
Sua participação foi negociada com seu pai. A proposta de integrar a chapa, segun<strong>do</strong><br />
relatos de sua mãe e dela própria, deveu-se a sua intensa participação nas<br />
atividades <strong>do</strong>s jovens (encontros e projetos). Mesmo assim, seu pai – que atuou<br />
junto com a esposa nas mobilizações após a formação <strong>do</strong> assentamento – resistiu<br />
à sua participação. Claudinha debitou essa resistência ao fato de ser filha mulher<br />
e avaliou que se fosse um <strong>do</strong>s irmãos não haveria problema. Apesar da sua participação,<br />
nem ela e nem os demais “jovens” perceberam um maior espaço na<br />
diretoria ou na Associação. A posição que ocupou na diretoria, secretária, foi a<br />
mesma que outras mulheres ocuparam, como Dália na última gestão de Tadeu<br />
e Emiliana na própria diretoria em que Dália foi presidente. Esse fato pode contribuir<br />
para se entender o episódio trata<strong>do</strong> na introdução desse trabalho, qual<br />
seja, a resistência <strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s à única vez que uma mulher ocupou o cargo de<br />
presidente da APPME. Retoman<strong>do</strong> os encontros com Dália e as impressões que<br />
ouvimos sobre sua gestão, pode-se afirmar que embora a própria Dália não tenha<br />
se identifica<strong>do</strong> como jovem, ela era percebida assim à época em que ocupou o cargo<br />
e, como tal, tratada a partir de referências de pouca confiabilidade que os jovens,<br />
e mais ainda as jovens, afirmaram experimentar como tratamento recebi<strong>do</strong> pelos