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texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná

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próprio Zaratustra, quan<strong>do</strong> desce a montanha, está por volta <strong>do</strong>s quarenta anos.<br />

Passou dez anos sozinho, compreenden<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, e voltou para anunciar a vinda<br />

<strong>do</strong> além-<strong>do</strong>-homem. O além-<strong>do</strong>-homem anuncia<strong>do</strong> por Zaratustra é ele próprio. É<br />

indispensável para a formulação de uma arte sobre a vida que os próprios<br />

parâmetros sejam defini<strong>do</strong>s por e para si mesmo. O além-<strong>do</strong>-homem seria aquele<br />

ser capaz disso 17 .<br />

Fileto, em No Hospício, possui esse conhecimento sereno-jovial, no início.<br />

A sua vida se fundamenta por seus próprios parâmetros, sen<strong>do</strong>, desta forma, mais<br />

interessante para ele viver recluso <strong>do</strong> que em liberdade, pois a reclusão (tanto<br />

quanto a retirada de Zaratustra para a montanha) representa, por um la<strong>do</strong>, uma<br />

possibilidade de interiorização, e por outro uma possibilidade de liberdade de<br />

espírito que não poderia ser alcançada se inseri<strong>do</strong> em uma coletividade. E essa<br />

liberdade poderia permitir não somente a interiorização, mas a expansão dessa<br />

força interior sobre o mun<strong>do</strong> exterior. Era possível a Fileto, no início <strong>do</strong> romance,<br />

a consolidação de uma vida artística que, aos pouco, com muita eficiência, é cada<br />

vez mais desestruturada pelo narra<strong>do</strong>r. E, dessa desestruturação, quan<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

afastamento <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r, Fileto sente que nada mais sobra em sua vida. Não<br />

consegue mais voltar a sua forma de estrutura de vida como fazia antes, mas sabe-<br />

se condena<strong>do</strong> (hybris). O que lhe resta é o apego ao além, desejan<strong>do</strong>, dessa forma,<br />

não mais contemplar e compreender o mun<strong>do</strong>, mas sair dele. Deseja, então, a<br />

redenção, e, com ela, a morte.<br />

Porém, faz-se necessário aprofundar mais a questão para Nietzsche, pois<br />

caso seja deixada como está, poderiam-se até mesmo achar alguns paralelos entre a<br />

vinda <strong>do</strong> além-<strong>do</strong>-homem e a vinda <strong>do</strong> messias. A grande diferença repousa sobre<br />

o que seria esse além-<strong>do</strong>-homem nietzschiano. Ele não viria para a redenção <strong>do</strong>s<br />

oprimi<strong>do</strong>s. Não viria para punir os opressores. Ele é, efetivamente, um homem que<br />

diz “sim” a si mesmo (essa é a força que Fileto não possui mais ao final <strong>do</strong><br />

17 “Nada está mais condiciona<strong>do</strong>, digamos mais limita<strong>do</strong>, que o nosso sentimento <strong>do</strong> belo.<br />

Quem o imaginasse desliga<strong>do</strong> <strong>do</strong> prazer que um homem pode causar a outro homem perderia<br />

em seguida o solo e o terreno sob seus pés. O ‘belo em si’ não é mais que uma palavra, não e<br />

sequer um conceito. No belo o homem considera-se a si mesmo como medida da perfeição; em<br />

certos casos a<strong>do</strong>ra-se a si mesmo no belo. Só desse mo<strong>do</strong> pode uma espécie dizer sim a si<br />

mesma. (...) O homem crê que o mun<strong>do</strong> está sobrecarrega<strong>do</strong> de beleza, — esquece que ele é a<br />

causa dessa beleza. Só ele concedeu ao mun<strong>do</strong> o <strong>do</strong>m da beleza, ai!, só que de uma beleza<br />

muito humana, demasia<strong>do</strong> humana... No fun<strong>do</strong> o homem contempla-se no espelho das coisas,<br />

considera belo tu<strong>do</strong> o que lhe devolve a sua imagem: o juízo ‘belo’ é a sua vaidade de<br />

espécie...” (NIETZSCHE, F. Crepúsculo <strong>do</strong>s í<strong>do</strong>los. Trad. Delfim Santos F.º. Lisboa:<br />

Guimarães Editora, 1985. 93.)

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