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texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná

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Ha espanto na côrte! Chamam-se os sabios <strong>do</strong> reino, os adivinhos, os feiticeiros<br />

famosos, os astrologos; e to<strong>do</strong>s, estupefactos, contemplam – affasta<strong>do</strong>s e tremulos de<br />

assombro – o principe sereno. E durante toda a longa noite – como um i<strong>do</strong>lo que<br />

affronta as edades – elle se conserva pasma<strong>do</strong> para uma estrella, para a mais formosa<br />

das estrellasm que enchem a parte visivel <strong>do</strong> ceu. De instante a instante, abala-se e<br />

ergue-se, e fica arrebata<strong>do</strong>, convulso como um hysterico, a tiritar, fitan<strong>do</strong> a estrella,<br />

como si quizesse devoral-a, sedento <strong>do</strong> luar <strong>do</strong>s astros...<br />

Afinal, o grande conselho <strong>do</strong> reino entende que o caso é extraordinario e que os<br />

destinos da nação reclamam uma providencia excepcional e suprema: a visita <strong>do</strong> grande<br />

patriarca Siong.<br />

Siong vive isola<strong>do</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, num vasto templo deserto, no alto de immensa<br />

montanha, solar aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> de deuses que morreram. Ali vive soluçante, a orar pelos<br />

martyres esqueci<strong>do</strong>s, cujos manes <strong>do</strong>lorosos povoam de sombras a solidão <strong>do</strong> retiro. O<br />

povo acredita que Siong é immortal e que não veiu ao mun<strong>do</strong> como os outros homens,<br />

pois não consta que alguem tivesse visto o patriarcha moço; mas to<strong>do</strong>s o conhecem, ha<br />

mais de um seculo, sempre com as longas barbas brancas, placi<strong>do</strong> sempre e sempre<br />

meigo como os infantes loiros.<br />

Muito reverente e muito pontifical, o patriarcha penetrou na camara <strong>do</strong> principe.<br />

Era noite, e o principe não se moveu. No seu extase, parecia ter a alma deslumbrada<br />

daquella estrella.<br />

O patriarcha ali ficou toda a noite, em silencio, mas com o espirito agita<strong>do</strong>,<br />

como de estranhas visões . e lá pela madrugada, quan<strong>do</strong> os grandes <strong>do</strong> palacio andavam<br />

exhaustos de vigilias sem fim, o patriarcha lhes apparece, muito reverente e muito<br />

pontifical, e, no meio da estupefacção que anda enchen<strong>do</strong> as arcadas <strong>do</strong> palacio, á meia<br />

luz mysteriosa de lampadas colossaes que esmoreciam, ouviu-se, profunda e solemne,<br />

como sentença de oraculo, a voz <strong>do</strong> patriarcha:<br />

“O principe Tientsin – disse elle – está ataca<strong>do</strong> da <strong>do</strong>ença divina <strong>do</strong>s filhos <strong>do</strong><br />

ceu. Durante esta noite pude sondar-lhe a alma, e senti que, das profundezas <strong>do</strong> seu<br />

pensamento surgia, de instante a instante, uma recordação que o agitava – a<br />

reminiscencia – talvez de uma outra vida passada em mun<strong>do</strong> excellente, onde se vive <strong>do</strong><br />

luar ineffavel das noites constelladas; onde os reis são apstores, os pastores poetas, e<br />

onde os poetas amam a<strong>do</strong>ran<strong>do</strong>. E o que o principe Tientsin agora sente é uma saudade<br />

infinita daquella antiga existencia. Por isso, elle passa as noites a procurar no ceu<br />

aquella estrella, morren<strong>do</strong> da nostalgia <strong>do</strong> além – a divina <strong>do</strong>ença <strong>do</strong>s filhos <strong>do</strong> ceu.

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