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texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná

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metafísica e filosofia; <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de um senso moral e, acima de tu<strong>do</strong>, de uma agudeza <strong>do</strong>s<br />

senti<strong>do</strong>s. Uma pessoa assim, colocada sob os efeitos <strong>do</strong> haxixe, receberá a infusão final de<br />

sua imaginação, o que fará com que acredite em sua própria divindade.<br />

Se compara<strong>do</strong> com o herói <strong>do</strong> romance Às avessas, de Huysmans, essa descrição<br />

<strong>do</strong> poeta <strong>do</strong> futuro de Baudelaire fica muito próxima da imagem de des Esseintes. No<br />

livro de Huysmans, a personagem principal – e quase que a única, salvo alguns cria<strong>do</strong>s<br />

e outros presta<strong>do</strong>res de serviço que aparecem no <strong>texto</strong> – vive isolada <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>,<br />

trancafiada dentro de si mesma. Em sua casa, para a qual ela vai crian<strong>do</strong> teorias sobre os<br />

objetos que lá existem, des Esseintes constrói toda a sua realidade, sem a necessidade de<br />

recorrer a intervenções externas. Para ele, as suas sensações sobre o mun<strong>do</strong> bastam para<br />

explicá-lo. O mun<strong>do</strong> só faz senti<strong>do</strong> pela sua interferência. Nervoso, irrita<strong>do</strong> e<br />

desconfia<strong>do</strong> com os demais seres humanos que por ventura venham a cruzar o seu<br />

caminho, des Esseintes busca a intelectualização como a sua forma de construir as<br />

correspondências entre si mesmo e o mun<strong>do</strong>.<br />

Vivia de si mesmo, nutria-se de sua própria substancia, à semelhança desses bichos<br />

a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>s, enfia<strong>do</strong>s num buraco durante o inverno; a solidão agira-lhe sobre o cérebro,<br />

feita um narcótico. Após tê-lo posto, a princípio, nervoso e tenso, trazia-lhe agora um<br />

torpor assombra<strong>do</strong> de vagas cismas; aniquilava os seus desígnios, desfazia as suas<br />

vontades, promovia um desfile de sonhos que ele suportava passivamente, sem mesmo<br />

tentar subtrair-se dele. (HUYSMANS, 1987, 106)<br />

Estruturalmente, o romance é divi<strong>do</strong> por cada uma das “aventuras” de des<br />

Esseintes com o mun<strong>do</strong>. Não há possibilidade de definição clara sobre o tempo ou o<br />

espaço, pois são elementos que passam a existir somente pelo olhar da personagem.<br />

Uma vez que o mun<strong>do</strong> é construção subjetiva e não-natural as relações espaço-temporal<br />

só são possíveis pela “deformação” causada por des Esseintes. Cada um <strong>do</strong>s capítulos<br />

corresponde a uma elaboração de suas teorias sobre questões estéticas e intelectuais que<br />

procurem dar maior harmonia ao caos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Des Esseintes formula teorias sobre<br />

cores, sons, móveis, livros, flores. Todas elas servem para que a personagem consiga<br />

inserir-se no Templo da Natureza (como diz Baudelaire em Correspondences –<br />

ANEXO 08). Entretanto, todas as buscas são individuais e a sua necessidade de resposta<br />

só diz respeito ao próprio des Esseintes. E, dentro desta necessidade, des Esseintes sabia<br />

ser isso algo somente seu e não uma coisa “natural”. Ele não queria as flores, por<br />

exemplo, em esta<strong>do</strong> natural, mas a sua combinação artificial, regida por uma<br />

apropriação estética que as colocaria em harmonia entre si e com o mun<strong>do</strong>. De acor<strong>do</strong><br />

com ele, tu<strong>do</strong> o que é deixa<strong>do</strong> em esta<strong>do</strong> natural não consegue cumprir a perfeição. Se o

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