texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná
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cadeias de correspondências, o homem que vê o mun<strong>do</strong> percebe-se parte dele e não um<br />
mero observa<strong>do</strong>r externo. É um ser que faz parte não somente como matéria integrante<br />
<strong>do</strong> universo, mas como essencial para a existência e senti<strong>do</strong> de toda a realidade.<br />
Esse ponto caracteriza uma ruptura forte com to<strong>do</strong> o pensamento ocidental<br />
até o final <strong>do</strong> século XIX. Desde o início <strong>do</strong> Ocidente, a justificativa para a<br />
existência e para a vida em geral era da<strong>do</strong> por forças que atuavam na vida, mas<br />
cujas existências encontravam-se fora dela 3 . Essa linha de pensamento terá grande<br />
força durante o perío<strong>do</strong> medieval, quan<strong>do</strong> a força da Igreja atingirá um ponto<br />
máximo, poden<strong>do</strong> construir um modelo no qual a criação e, conseqüentemente, a<br />
justificativa da vida se encontram fora dela. Deus nega duas qualidades centrais<br />
para a vida na terra: o tempo e a matéria. Enquanto um ser eterno, Deus se coloca<br />
fora da temporalidade da vida humana, sen<strong>do</strong>, desta forma, superior a ela, uma vez<br />
que aquilo que traria a fraqueza para os seres humanos, a morte, não se aplicaria a<br />
Ele. E, enquanto um ser que não é constituí<strong>do</strong> de matéria, pode ser considera<strong>do</strong><br />
perfeito, pois está fora <strong>do</strong> esquema das mudanças necessárias para os corpos<br />
materiais.<br />
Esse esquema de estruturação de uma força superior ao homem parecia estar<br />
entran<strong>do</strong> em declínio quan<strong>do</strong> das revoluções burguesas. O burguês, tipicamente um<br />
homem constituí<strong>do</strong> pela sua força em sobrepor-se ao mun<strong>do</strong>, poderia ser pensan<strong>do</strong><br />
como um ser que foi capaz de se impor sobre a realidade adversa que o cercava.<br />
Em um mun<strong>do</strong> aristocrático, o burguês buscou espaço para justificar a sua<br />
supremacia no mun<strong>do</strong>. Afastan<strong>do</strong>-se de Deus como justificativa da sua posição<br />
social utilizada por nobres e demais aristocratas para a manutenção de seu status<br />
quo, a burguesia passa a usar um outro sustentáculo para a sua ação no mun<strong>do</strong>: a<br />
razão. O Iluminismo, que terá seu grande desenvolvimento durante o século XVIII<br />
3 Para tanto, considera-se o início <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ocidental não na fundação <strong>do</strong>s mitos gregos, como os que<br />
darão origem aos <strong>texto</strong>s iniciais da literatura ocidental (Ilíada e Odisséia), nem nos <strong>texto</strong>s <strong>do</strong> teatro trágico<br />
grego, mas na forma de pensamento dialético que fundará to<strong>do</strong> o pensamento <strong>do</strong> Ocidente, em especial o<br />
Ocidente Cristão. Para tanto, coloca-se o início <strong>do</strong> Ocidente nas teorizações de Platão (quan<strong>do</strong> este divide<br />
o universo em mun<strong>do</strong>s separa<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> um deles funda<strong>do</strong>r e justificativa <strong>do</strong> outro) e de Aristóteles (com<br />
as tentativas de classificação e racionalização sobre a realidade). Serão admitidas essas duas teorizações<br />
filosóficas como balizas iniciais <strong>do</strong> Ocidente pelo fato delas terem servi<strong>do</strong> de pontos de partida para toda<br />
a estruturação <strong>do</strong> pensamento cristão. O primeiro filósofo serviu como fonte para as teorizações de Santo<br />
Agostinho, dan<strong>do</strong> origem à Escolástica, substituin<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> ideal pelo conceito de Deus e construin<strong>do</strong><br />
uma justificativa filosófica sólida para o Cristianismo. E o segun<strong>do</strong>, servin<strong>do</strong> de base para as formulações<br />
de Santo Tomás de Aquino, ao produzir o Tomismo, quan<strong>do</strong> a leitura de Aristóteles é retomada na<br />
Europa, após séculos de silêncio e que dará a uma forma de encarar o universo como uma grande cadeia<br />
hierárquica na qual to<strong>do</strong>s os seres (reais ou imaginários) estão inseri<strong>do</strong>s, inician<strong>do</strong> no mais reles ser e<br />
continuan<strong>do</strong> até chegar a Deus.