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texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná

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possibilidade de atribuir à arte um senti<strong>do</strong> pleno. É o excesso de perfeição humana<br />

que produziria a arte. É reconhecer-se no mun<strong>do</strong> não enquanto uma parte da<br />

criação, mas como o próprio cria<strong>do</strong>r. Como foi fala<strong>do</strong> anteriormente, Fileto é<br />

descrito porta<strong>do</strong>r dessa força no início <strong>do</strong> romance, quan<strong>do</strong> é visto pelo narra<strong>do</strong>r<br />

como alguém que vive de criar mun<strong>do</strong>s, viven<strong>do</strong> dentro de suas próprias<br />

construções, isola<strong>do</strong> <strong>do</strong>s outros homens e, desta forma, justifican<strong>do</strong> a sua própria<br />

existência. Isso já não ocorre mais no final <strong>do</strong> romance, quan<strong>do</strong> Fileto já não basta<br />

mais para si mesmo, necessitan<strong>do</strong> <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r e, quan<strong>do</strong> esse falta, não mais<br />

conseguin<strong>do</strong> justificar a sua vida, anseia somente pela redenção.<br />

A vida, de acor<strong>do</strong> com Nietzsche, se baseia em uma constante mudança de<br />

padrões morais, se é que a palavra padrões poderia ser empregada para definir algo<br />

defini<strong>do</strong> pelo acaso. A forma como Nietzsche encara o espírito nobre é que dará o<br />

solo de onde poderá brotar a vida 20 . A destruição (diria Nietzsche, a golpes de<br />

martelo) <strong>do</strong>s padrões morais de rebanho e a formação de um espírito livre (que não<br />

poderia ser forma<strong>do</strong> pelo rebanho enquanto coletividade, mas que surgirá de dentro<br />

dele e não para ele), volta<strong>do</strong> para si próprio, perceben<strong>do</strong> a beleza da vida a partir<br />

de seus próprios padrões, não leva esse espírito ao nada, mas, bem pelo contrário,<br />

para uma existência completa. Se a existência é completa, não faz mais senti<strong>do</strong> a<br />

existência de outro mun<strong>do</strong> que não o nosso. Esse nosso mun<strong>do</strong> passa a ser múltiplo<br />

por essência, enquanto construí<strong>do</strong> artisticamente por cada um. Não um mun<strong>do</strong><br />

belo, mas que precisa ser torna<strong>do</strong> belo. A ausência de sofrimento, a afirmação da<br />

vida e pelo eterno retorno <strong>do</strong> mesmo, cria<strong>do</strong>s por um embelezamento da vida, faz<br />

com que esse ser que superou a condição humana olhe a vida com olhos<br />

diferencia<strong>do</strong>s. Que perceba na realidade toda a beleza que ele é capaz de nela<br />

encontrar 21 .<br />

20 “To<strong>do</strong> o naturalismo em moral, quero dizer, toda moral sã está regida por um instinto da<br />

vida, — um mandamento qualquer da vida é cumpri<strong>do</strong> com um certo cânone de ‘deves’ e ‘não<br />

deves’, um obstáculo e uma inimizade qualquer no caminho da vida ficam com isso<br />

elimina<strong>do</strong>s. A moral contranatural, ou seja, quase toda a moral até agora ensinada, venerada e<br />

pregada, dirige-se, pelo contrário, precisamente contra os instintos da vida, — é uma<br />

condenação, por vezes encoberta, por vezes rui<strong>do</strong>sa e insolente, desses instintos.”<br />

(NIETZSCHE, F. Crepúsculo <strong>do</strong>s í<strong>do</strong>los. Trad. Delfim Santos F.º. Lisboa: Guimarães<br />

Editora, 1985. 47.)<br />

21 “Nietzsche pretende destruir a idéia de que existem <strong>do</strong>is mun<strong>do</strong>s, apontan<strong>do</strong> para a<br />

existência de um único mun<strong>do</strong>, esse sim, terrível, perverso. Para conseguir habitar esse<br />

mun<strong>do</strong>, foi preciso torná-lo belo. Daí a invenção das diversas mentiras e, particularmente, da<br />

arte propriamente dita, num senti<strong>do</strong> amplo, em que todas essas ilusões são mo<strong>do</strong>s artísticos de<br />

concepção de mun<strong>do</strong>. A grande diferença entre a arte e as outras formas de ‘mentiras’ é que,<br />

as últimas se pretendem verdades, como, por exemplo, a ciência. Na arte, inversamente, trata-

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