texto integral - Allan Valenza.pdf - Universidade Federal do Paraná
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O choque de moralidades está presente em No Hospício. O narra<strong>do</strong>r, ao<br />
encontrar Fileto, sente um desconforto perante aquele espírito. Esse desconforto é<br />
da<strong>do</strong> mais por uma questão moral <strong>do</strong> que de qualquer outra natureza.<br />
A forma de superação está anunciada já no primeiro livro <strong>do</strong> filósofo<br />
alemão, O nascimento da tragédia (1999). Uma das teses centrais da obra<br />
filosófica de Nietzsche diz que a única possibilidade de justificativa da vida se dá<br />
por questões estéticas 22 . Porém, esse primeiro livro está ainda muito preso à figura<br />
<strong>do</strong> compositor alemão Richard Wagner. O rompimento dessa ligação foi motiva<strong>do</strong><br />
por uma mudança de postura pela parte de Nietzsche em relação a como encarar a<br />
idéia de povo; e, também, da explicitação da postura de Wagner em relação à<br />
formação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> alemão. A defesa de um Esta<strong>do</strong>, de um povo com<br />
características unificadas por parte de Wagner (que foi o músico toma<strong>do</strong> como<br />
mentor por toda a geração de simbolistas e ti<strong>do</strong> como o ponto mais eleva<strong>do</strong> da<br />
música, inclusive por Nietzsche em sua primeira fase), fará com que Nietzsche se<br />
distancie dele. Essa postura por parte de Nietzsche se deu devi<strong>do</strong> à impossibilidade<br />
de superação humana dada por instituições sobre-humanas. Assim como a Igreja, o<br />
cristianismo e Deus, o Esta<strong>do</strong> é ti<strong>do</strong> para Nietzsche como o grande recurso de um<br />
povo medíocre que não consegue se impor pela força <strong>do</strong>s indivíduos que o<br />
compõem, crian<strong>do</strong>, então, entidades maiores que eles mesmos e impedin<strong>do</strong> a<br />
possibilidade de elevação de espírito em nome da ordem e da lei. O exemplo <strong>do</strong><br />
que ocorre com Fileto, em No Hospício, interna<strong>do</strong> no hospício por desagradar e<br />
desobedecer a seus pais, é exemplar nessa questão. Assim como o exemplo <strong>do</strong><br />
interno da célula da frente, no mesmo romance, interna<strong>do</strong> por não aceitar os<br />
desejos de pessoas poderosas na sociedade também vale como referência.<br />
O Esta<strong>do</strong> moderno busca justificar as coisas a partir de sua própria<br />
existência. A queda <strong>do</strong> Ocidente para o ceticismo não foi algo questiona<strong>do</strong>r da<br />
se de ‘aparência enquanto aparência’. Não pretende enganar. Por isso, é verdadeira”.<br />
(PERRUSI, Martha Solange. Filosofia... Arte... Vida! 173-182. In: LINS, Daniel. Nietzsche e<br />
Deleuze – pensamento nômade. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2001. 175-176.)<br />
22 “Não existe contraposição maior à exegese e justificação puramente estética <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, tal<br />
como é ensinada neste livro, <strong>do</strong> que a <strong>do</strong>utrina cristã, a qual é e quer ser somente moral, e com<br />
seus padrões absolutos, já com sua veracidade de Deus, por exemplo, desterra a arte, toda<br />
arte, ao reino da mentira — isto é, nega-a, reprova-a, condena-a. Por trás de semelhante mo<strong>do</strong><br />
de pensar e valorar, o qual tem de ser adverso à arte, enquanto ela for de alguma maneira<br />
autêntica, sentia eu também desde sempre a hostilidade à vida, a rancorosa, vingativa aversão<br />
contra a própria vida: pois toda a vida repousa sobre a aparência, a arte, a ilusão, a óptica, a<br />
necessidade <strong>do</strong> perspectivístico e <strong>do</strong> erro”. (NIETZSCHE, F. O nascimento da tragédia – ou<br />
Helenismo e Pessimismo. Trad. J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. 19.)