Diretoria da EMERJ - Emerj - Tribunal de Justiça do Estado do Rio ...
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o caráter criativo e construtivo <strong>da</strong> ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> jurisdicional ante os chama<strong>do</strong>s<br />
“casos difíceis”, repudian<strong>do</strong> a tese <strong>da</strong> função meramente <strong>de</strong>clarativa<br />
<strong>da</strong> jurisdição. Noutras palavras: a teoria analítica hartiana admite que o<br />
or<strong>de</strong>namento jurídico é lacunoso e que os juízes dispõem <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r para<br />
criar o Direito.<br />
Hart marca a distinção entre normas primárias (impositivas <strong>de</strong> condutas)<br />
e secundárias (<strong>de</strong> instituições centraliza<strong>da</strong>s para criar e aplicar as<br />
normas primárias). Partin<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma hipotética socie<strong>da</strong><strong>de</strong> primitiva, conclui<br />
o pensa<strong>do</strong>r britânico que, eventual ausência <strong>de</strong> normas secundárias<br />
acarretaria graves distorções, <strong>de</strong>correntes principalmente <strong>de</strong> três causas<br />
fun<strong>da</strong>mentais: (i) insuficiente pressão social ten<strong>de</strong>nte ao cumprimento<br />
<strong>da</strong>s normas impositivas <strong>de</strong> conduta, ante a ausência <strong>de</strong> órgãos específicos<br />
a esse fim; (ii) estatici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> sistema, resultante <strong>da</strong> ausência <strong>de</strong> alteração<br />
e a<strong>da</strong>ptação <strong>da</strong>s normas às modificações ocorri<strong>da</strong>s no plano fático,<br />
social; (iii) incerteza quanto ao senti<strong>do</strong> e alcance <strong>da</strong>s normas primárias<br />
vigentes no sistema. 13<br />
Aponta Hart, portanto, para a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> complementação <strong>da</strong>s<br />
regras primárias pelas secundárias, <strong>de</strong> forma a conferir ao regime <strong>de</strong> regras<br />
um caráter <strong>de</strong> sistema. Na sua visão, o Direito po<strong>de</strong> ser caracteriza<strong>do</strong><br />
como uma união <strong>de</strong> regras primárias <strong>de</strong> obrigação com regras secundárias<br />
institucionais.<br />
Ao contrário <strong>da</strong>s normas primárias, as normas secundárias não<br />
criam obrigações, mas atribuem po<strong>de</strong>res. Na ótica hartiana, existem três<br />
tipos <strong>de</strong> normas secundárias: (i) <strong>de</strong> julgamento, disciplina<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> processo<br />
e i<strong>de</strong>ntificação <strong>do</strong>s órgãos e pessoas que <strong>de</strong>vem julgar; 14 (ii) <strong>de</strong> alteração,<br />
que confere po<strong>de</strong>r a um indivíduo ou corpo <strong>de</strong> indivíduos para<br />
introduzir novas regras primárias disciplina<strong>do</strong>ras <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social; 15 e (iii) <strong>de</strong><br />
reconhecimento, que serve para estabelecer critérios <strong>do</strong>ta<strong>da</strong>s <strong>de</strong> autori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para i<strong>de</strong>ntificar a regras váli<strong>da</strong>s <strong>do</strong> or<strong>de</strong>namento jurídico. 16<br />
Quanto às normas secundárias <strong>de</strong> reconhecimento (rule of recognition),<br />
Hart assinala que a sua existência não expressaria senão uma questão<br />
<strong>de</strong> fato, in litteris:<br />
13 HART, H. L. A. O Conceito <strong>de</strong> Direito. Tradução Armin<strong>do</strong> Ribeiro Men<strong>de</strong>s. Lisboa: Fun<strong>da</strong>ção Calouste Gulbenkian,<br />
1986, p. 102-106<br />
14 Ibi<strong>de</strong>m, p. 106.<br />
15 Ibi<strong>de</strong>m, p. 105.<br />
16 Ibi<strong>de</strong>m, p. 104.<br />
R. <strong>EMERJ</strong>, <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro, v. 14, n. 56, p. 125-144, out.-<strong>de</strong>z. 2011 131