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Ao descer a colina, passamos pelo meu lugar, e desta vez fui eu quem
desviou o olhar, como se tivesse esquecido o que aconteceu. Tenho certeza
de que se olhasse para ele naquele momento, teríamos trocado o mesmo
sorriso contagiante que sumira imediatamente de nosso rosto quando ele
citou a morte de Shelley. Poderia ter nos aproximado, só para nos lembrar do
quanto precisávamos nos afastar. Talvez, ao desviar o olhar e saber que
tínhamos desviado para evitar “discursos”, tivéssemos encontrado um motivo
para sorrir um para o outro, pois tenho certeza de que ele sabia que eu sabia
que ele sabia que eu estava evitando qualquer menção ao penhasco de Monet,
e que essa atitude, que deveria nos separar, era, na verdade, um momento
perfeitamente sincronizado de intimidade que nenhum de nós desejava
dissipar. Esse lugar também está naquele livro, eu poderia ter dito, mas me
contive.
Sem discursos.
No entanto, se durante o passeio das manhãs seguintes ele perguntasse, eu
falaria tudo.
Contaria que embora pedalássemos todos os dias até nossa piazzetta
preferida, onde eu decidia nunca falar fora de hora, todas as noites, quando eu
sabia que ele estava na cama, ainda abria a persiana e ia até a varanda,
torcendo para que ele ouvisse o som revelador das dobradiças antigas quando
minha porta se abrisse. Esperava por ele lá, apenas com o short do pijama,
pronto para declarar, se ele perguntasse o que eu estava fazendo ali, que a
noite estava muito quente e o cheiro de citronela insuportável, e que eu
preferia ficar acordado, sem dormir, sem ler, só olhando para o nada, porque
não conseguia dormir, e se ele perguntasse por que eu não conseguia dormir,
simplesmente responder Você não quer saber, ou, de maneira indireta, dizer
que eu tinha prometido nunca passar para o lado dele da sacada, em parte
porque morria de medo de ofendê-lo, mas também porque não queria testar a
armadilha invisível entre nós — De que armadilha você está falando? ; a
armadilha que, uma noite dessas, se meu sonho fosse muito poderoso ou eu
tivesse bebido mais vinho que o normal, poderia acionar facilmente, abrir sua
porta e dizer Oliver, sou eu, não consigo dormir, posso ficar com você? Essa
armadilha!