12.03.2020 Views

Me Chame Pelo Seu Nome - André Aciman

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

velho e implacável padre confessor. Uma multidão tinha se reunido em torno

do grande bardo, que permanecia imóvel na calçada, com os braços cruzados

em uma postura provocadora, o corpo todo ereto, como um homem

esperando por Virgílio ou pelo metrô.

Quando um turista jogou uma moeda em um livro antigo oco, ele simulou o

olhar apaixonado de um Dante que tinha acabado de ver sua Beatriz

atravessando a Ponte Vecchio e, esticando o pescoço comprido,

imediatamente gemeu, como um artista de rua que cospe fogo, Guido, vorrei

che tu e Lapo ed io fossimo presi per incantamento, e messi ad un vascel,

ch’ad ogni vento per mare andasse a voler vostro e mio.

Guido, quisera que tu e Lapo e eu fôssemos tomados por um encantamento, e

postos numa nau, ao bel-prazer do vento percorrendo o mar segundo o desejo

teu e meu.

Quanta verdade, pensei. Oliver, eu queria que você e eu e todos de quem

gostamos pudéssemos viver para sempre na mesma casa… Depois de proferir

os versos com uma voz suave, ele lentamente voltou à posição feroz e

misantrópica de antes até outro turista jogar uma moeda.

E io, quando ’l suo braccio a me distese, ficcaï li occhi per lo cotto aspetto, sì

che ’l viso abbrusciato non difese la conoscenza süa al mio ’ntelletto;

e chinando la mano a la sua faccia, rispuosi: “Siete voi qui, ser Brunetto?” E

eu, logo que ele o braço me esticou, tanto espreitei seu abrasado aspecto, que

o crestado do rosto não obstou seu reconhecimento ao meu intelecto, e, para o

dele baixando o meu rosto, “Sois vós aqui”, indaguei, “ser Brunetto?”.

Mesmo olhar desdenhoso. Mesma cara fechada. A multidão se dispersou.

Ninguém pareceu reconhecer a passagem do Canto XV do Inferno na qual

Dante encontra o antigo professor, Brunetto Latini, entre os homossexuais.

Dois americanos, que finalmente conseguiram encontrar algumas moedas na

mochila, lançaram uma chuva de moedinhas. Mesmo olhar furioso e

ameaçador: Ma che ciarifrega, che ciarimporta, se l’oste ar vino cia messo

l’acqua: e noi je dimo, e noi je famo, “ciai messo l’acqua e nun te pagamo!”.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!