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assim que abri o armário, ali estava ele. Pendurado em um cabide, o calção de
banho vermelho que ele tinha usado naquela manhã. Pendurado ali e não na
varanda para secar, porque ele não tinha ido nadar com ele. Peguei o calção.
Nunca tinha mexido nos pertences de alguém antes. Levei o tecido ao rosto,
esfreguei o rosto dentro dele, como se tentasse me aconchegar e me perder
em suas costuras. Então esse é seu cheiro quando não está coberto de protetor
solar, esse é seu cheiro, esse era seu cheiro, repeti várias vezes para mim
mesmo, procurando dentro do calção por algo ainda mais pessoal e depois
beijando cada pedaço, quase desejando encontrar um pelo, qualquer coisa,
lambê-lo, colocá-lo inteiro na boca e, se fosse capaz de roubá-lo, ficar com
ele para sempre, nunca deixar que Mafalda o lavasse, pegá-lo nos meses de
inverno em casa e, ao cheirá-lo, trazê-lo de volta à vida, tão nu quanto estava
naquele exato momento comigo. Por impulso, tirei meu calção e comecei a
vestir o dele. Eu sabia o que queria, e queria com o tipo de êxtase inebriante
que faz com que as pessoas corram riscos que jamais correriam por mais
álcool que tivessem no corpo. Eu queria gozar no calção dele, e deixar a
prova lá para que ele encontrasse. Foi então que uma ideia louca tomou conta
de mim. Desfiz sua cama, tirei o calção e me enrolei em seus lençóis, nu. Que
ele me encontre aqui. Dou um jeito de lidar com a situação. Reconheci a
sensação daquela cama. Minha cama. Mas o cheiro dele estava por todo lado,
robusto e indulgente, como o cheiro estranho que de repente tomou meu
corpo inteiro quando um velho que estava ao meu lado em um templo no
Yom Kipur colocou seu tallis na minha cabeça até que eu quase
desaparecesse, em união com uma nação para sempre dispersa, mas que, de
tempos em tempos, se reúne novamente quando dois seres se envolvem no
mesmo pedaço de pano.
Coloquei seu travesseiro em meu rosto, beijei-o com brutalidade e,
colocando-o entre minhas pernas, contei-lhe o que não tinha coragem de
contar a mais ninguém no mundo. Então contei-lhe o que eu desejava. Levou
menos de um minuto.
O segredo tinha saído do meu corpo. E daí se ele visse. E daí se ele me
pegasse ali. E daí, e daí, e daí.
No caminho de volta ao meu quarto me perguntei se seria louco o suficiente
de tentar fazer aquilo de novo.