Diacritica 25-2_Filosofia.indb - cehum - Universidade do Minho
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A MECÂNICA DO SENTIR – RACIONALIDADE E MIMESIS NA PERFORMANCE MUSICAL<br />
Prazer, processamento, e repetição<br />
207<br />
Partin<strong>do</strong> da linguística, Lerdahl & Jacken<strong>do</strong>ff (1983) propõem em A Generative<br />
Th eory of Tonal Music (GGTM) uma teorização da cognição musical<br />
segun<strong>do</strong> a qual ouvintes familiariza<strong>do</strong>s com o idioma constroem senti<strong>do</strong><br />
musical a partir da segmentação e hierarquização de elementos, numa ‘gramática’<br />
que envolve a métrica (Metrical structure - tempos fortes e fracos)<br />
e a segmentação e hierarquização de motivos, frases e secções (grouping<br />
structure e reductional structure) (cf. Jacken<strong>do</strong>ff 1992: 52).<br />
Procuran<strong>do</strong> reunir o enquadramento perceptivo desenvolvi<strong>do</strong> em<br />
GGTM com as noções de expectativas, ou implicações desenvolvidas por<br />
Narmour (1977) e Meyer (1956, 1967a, 1967b, 1973), bem como com a teorização<br />
<strong>do</strong> processamento da informação na linguagem (Bever et al, 1973;<br />
Frazier & Fo<strong>do</strong>r, 1978 ; Wanner & Maratssos, 1978; Swinney, 1979; Tanenhaus<br />
et al, 1979; Marcus, 1980), Jacken<strong>do</strong>ff (1992: 64), propõe a existência<br />
de uma ‘função de selecção’ que, confrontada com várias possibilidades<br />
de continuação, singulariza a mais provável, reprocessan<strong>do</strong> a informação a<br />
partir <strong>do</strong> ponto de selecção (ambiguidade) sempre que a escolha se revelou<br />
errada. É desse processamento que resulta, entre outros factores (e. g.,<br />
intensidade), a emoção (Jacken<strong>do</strong>ff 1992: 64).<br />
Só parcialmente, porém, pois, de acor<strong>do</strong> com Jacken<strong>do</strong>ff (1992: 66),<br />
não se colocaria em princípio a questão da frustração de expectativas no<br />
caso de obras conhecidas de antemão. É nesse contexto que Jacken<strong>do</strong>ff<br />
(1992: 67) sustenta a natureza ‘cega’ <strong>do</strong> processa<strong>do</strong>r, segun<strong>do</strong> a qual este<br />
não só dispõe apenas das regras gramaticais, como as aplica de mo<strong>do</strong> automático<br />
em resposta a qualquer estímulo a partir <strong>do</strong> qual seja passível o<br />
desenvolvimento de uma análise. Nesse entendimento, o processa<strong>do</strong>r trata<br />
a informação de forma independente da consciência prévia que temos <strong>do</strong>s<br />
eventos (em obras conhecidas), como se fosse a primeira vez, exigin<strong>do</strong> uma<br />
continuação a partir das regras interiorizadas que é independente da consciência<br />
e conhecimento prévio da sequência de eventos. Assim, o afecto<br />
emerge porque o processa<strong>do</strong>r exige uma reavaliação retrospectiva sempre<br />
que um evento, ainda que conheci<strong>do</strong> antecipadamente, não se conforme à<br />
gramática interiorizada. A teoria <strong>do</strong> afecto decorre assim, de acor<strong>do</strong> com<br />
Jacken<strong>do</strong>ff (1992: 67), de uma dupla operação, ou duas operações com relativa<br />
autonomia: o processa<strong>do</strong>r reage a uma peça conhecida de antemão<br />
como de uma primeira escuta se tratasse.<br />
<strong>Diacritica</strong> <strong>25</strong>-2_<strong>Filosofia</strong>.<strong>indb</strong> 207 05-01-2012 09:38:30