Diacritica 25-2_Filosofia.indb - cehum - Universidade do Minho
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4.3. Teoria da mente e simulação<br />
VÍTOR MOURA<br />
É erra<strong>do</strong> pretender que o cinema se baseia na criação de uma ilusão de<br />
realidade. Ele apela à nossa imaginação, não ao nosso sistema de crenças.<br />
Currie começa por invocar a operação psicológica conhecida como Teoria<br />
da Mente, que se desenvolve nas crianças a partir <strong>do</strong>s 3 – 4 anos de idade. [28]<br />
Pode defender -se que a criança adquire uma capacidade, que é mais uma<br />
aquisição de um saber -como <strong>do</strong> que de um saber -que. O colocar -se no lugar<br />
de alguém e observar como é que eu reajo imaginativamente, implica que<br />
os meus processos mentais normais são empregues de uma forma “desembraiada”<br />
ou “off -line”. Adquiro crenças e desejos imaginários que diferem<br />
<strong>do</strong> meu sistema normal de crenças e desejos, são temporários e canceláveis,<br />
e encontram -se desliga<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s inputs perceptivos normais e <strong>do</strong>s outputs<br />
comportamentais comuns.<br />
A Hipótese da Simulação, de Roy Sorensen, transpõe a forma da Teoria<br />
da Mente para a explicação <strong>do</strong> papel da imaginação na fi cção: antes de<br />
ter uma Teoria da Mente, a criança é incapaz de se projectar imaginativamente<br />
sobre a posição de outrem; depois de a ter, a criança torna -se capaz<br />
de efectuar uma simulação que a<strong>do</strong>pta como condições iniciais um esta<strong>do</strong><br />
perceptivo diferente <strong>do</strong> seu. Isto signifi ca que nós possuímos um modelo<br />
fi ável <strong>do</strong>s processos mentais das outras pessoas, nomeadamente, os nossos<br />
próprios processos mentais funcionan<strong>do</strong> fora de embraiagem. Pertencer à<br />
média mental confere importantes vantagens selectivas pelo que é expectável<br />
que a maior parte da população seja mentalmente semelhante. Quanto<br />
mais pareci<strong>do</strong>s formos uns em relação aos outros, tanto mais fi ável será o<br />
processo da modelação mental. E quanto mais mediano eu for, mais e mais<br />
pessoas serei capaz de simular com êxito. Portanto, é de esperar uma aceleração<br />
na direcção da homogeneidade mental.<br />
As fi cções contam histórias e isso implica que as várias partes da história<br />
nos autorizam a imaginar certas coisas, proibin<strong>do</strong> -nos de imaginar<br />
outras. O senti<strong>do</strong> de “imaginar” no âmbito da fi cção será, então, este:<br />
trata -se <strong>do</strong> processo de desenvolver esta<strong>do</strong>s mentais off -line. A partir <strong>do</strong><br />
28 Um breve exemplo será sufi ciente para ilustrar a apresentação da Teoria da Mente. Dois pais<br />
brincam com o fi lho. O jogo consiste em esconder uma bola num de entre três copos opacos e<br />
em perguntar onde se encontra escondida a bola. A certa altura, o pai sai da sala e a mãe troca a<br />
bola, que estava no copo A, para o copo B. Quan<strong>do</strong> o pai regressa ao jogo, pergunta -se à criança<br />
onde acha que o pai pensa que está a bola. Antes <strong>do</strong>s 3 anos, a criança responderá “Copo B”,<br />
uma vez que ainda não é capaz de simular a perspectiva <strong>do</strong> pai durante a saída da sala. Quan<strong>do</strong><br />
apreende a Teoria da Mente, a criança responderá “Copo A”, sinal de que consegue interpretar<br />
a realidade à luz da perspectiva <strong>do</strong> sujeito que é agora capaz de simular.<br />
<strong>Diacritica</strong> <strong>25</strong>-2_<strong>Filosofia</strong>.<strong>indb</strong> 272 05-01-2012 09:38:34