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Diacritica 25-2_Filosofia.indb - cehum - Universidade do Minho

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LUZES, CÂMARA OU ACÇÃO? TRÊS ONTOLOGIAS PARA A IMAGEM EM MOVIMENTO<br />

<strong>25</strong>3<br />

acreditarmos que alguém está num determina<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> mental. O esta<strong>do</strong> de<br />

suspense <strong>do</strong> cinéfi lo não é igual ao sofrimento de um terror real. Em segun<strong>do</strong><br />

lugar, em termos puramente introspectivos, o Ilusionismo parece contrariar<br />

a experiência comum de assistir a um fi lme. O especta<strong>do</strong>r teria de assumir,<br />

por exemplo, que a sua perspectiva é a da câmara, o que implicaria, por<br />

vezes, supor -se coloca<strong>do</strong> em posições absurdas ou impossíveis, como seja<br />

um travelling que atravessa paredes e edifícios inteiros, ou a súbita subida até<br />

ao plano pica<strong>do</strong> vertiginoso da torre da igreja, que sucede ao “suicídio” de<br />

Madeline em Vertigo. Ou então seria muito difícil integrar na nossa experiência<br />

o jogo de cortes e elipses que caracteriza a montagem.<br />

Há versões mais fracas <strong>do</strong> Ilusionismo que estão preparadas para escapar<br />

a estas objecções. Numa delas, o esta<strong>do</strong> mental <strong>do</strong> especta<strong>do</strong>r é compara<strong>do</strong><br />

a uma espécie de sonhar acorda<strong>do</strong>. A câmara corresponderia a um<br />

“olho interno” através <strong>do</strong> qual percepcionamos as imagens <strong>do</strong>s sonhos.<br />

Mas também isto traz problemas. Nos sonhos, sentimos normalmente uma<br />

motivação para agir, designadamente quan<strong>do</strong> nos “encontramos” em situações<br />

de perigo. Mas no cinema, não. Por outro la<strong>do</strong>, ao sonhar, a personagem<br />

central é o próprio sonha<strong>do</strong>r ao passo que o cinema esforça -se por<br />

suprimir a consciência <strong>do</strong> Eu em favor da fi cção. Uma outra versão fraca <strong>do</strong><br />

Ilusionismo, o Ilusionismo Perceptivo, estabelece analogias entre a experiência<br />

da imagem em movimento e certo tipo de ilusões ópticas, como seja<br />

o caso das setas de Müller -Lyre: mesmo saben<strong>do</strong> que as setas são <strong>do</strong> mesmo<br />

tamanho, nós vemo -las como ten<strong>do</strong> tamanhos diferentes, ou seja, a sua percepção<br />

é “cognitivamente impenetrável” porque a crença não afecta o mo<strong>do</strong><br />

como as vemos. Algo de semelhante se passaria no cinema porque, apesar<br />

de o especta<strong>do</strong>r saber que está a observar uma sequência rápida de imagens<br />

fi xas, o que nele se induz é uma percepção (ilusória) de movimento.<br />

É neste senti<strong>do</strong> que autores como Francis Sparshott ou Hugo Munsterberg<br />

defendem que apenas parece que vemos movimento no ecrã. O Ilusionismo<br />

Perceptivo supõe, portanto, que o especta<strong>do</strong>r desenvolve uma espécie de<br />

falsa consciência e que o cinema vive desta tensão entre conhecimento e<br />

percepção. É fácil de entender que este tipo de Ilusionismo tem gera<strong>do</strong><br />

reacções negativas por parte de muitos autores [5] , que não hesitam em prever<br />

que esta falsa consciência perceptiva acabará por gerar consequências<br />

epistemológicas e ontológicas muito negativas. Enquadra<strong>do</strong> desta maneira,<br />

o cinema tornar -se -ia um instrumento óbvio ao serviço das grandes ilusões<br />

ideológicas embora não seja exactamente claro como é que da proposta de<br />

5 Como Gregory Currie, como veremos.<br />

<strong>Diacritica</strong> <strong>25</strong>-2_<strong>Filosofia</strong>.<strong>indb</strong> <strong>25</strong>3 05-01-2012 09:38:33

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