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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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anos, quando fui Rei e Poeta; e parece que uma parte do meu ser morre nesseinstante, irremediavelmente, na luz que se extingue. Amanhã já não serei omesmo: a minha alma deve fazer diferença. Deixa-me explicar-te isto melhor:é como se eu fosse composto de diferentes seres, cada um com as suas ideias,os seus sonhos e as suas ilusões, e, por cada tarde que finda, na luz que cerraos olhos, um desaparecesse para sempre, levando-me uma parte de ventura ede tristeza...Há tardes que se evolam como perfumes; enchem de nostalgia e enervam...Eu nunca estou só. Quando me isolo é que estou mais acompanhado.Aí vem, aí vem a desesperada hora do crepúsculo... É dia de entrudo hoje.A rua está muda. Só a chuva cuspinha, há lama negra, um lampião começa abrilhar com uma tristeza feita de tédio e de coisas miúdas, vazias e nulas, e umbêbado dá arrancos, com baques pícaros nas lajes...Bem sei, é a desesperada hora do crepúsculo; escusavas, bêbado, de mo virlembrar com os teus berros de uma amargura que põe os cabelos em pé, ecom os teus tombos pela lama mole e negra, que me degradam, como se mesalpicasses de vómitos, e me fazem pensar no suicídio... Aí vêm os mortos, aívem Hélia, de mãos estendidas para mim, aí vem a noite, os fantasmas, a cova,bem o sei... Cala-te! É inútil, tudo é inútil: não é a luz do candeeiro que fazsurgir os espectros, quando a minha alma está cheia deles, como de negrasfalenas. Tu, para quem escrevo estas últimas linhas, homem, escuta... A ciência

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