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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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— Não, senhor Pita, por mais que queira não posso. O que me oferecem éa voluptuosidade. Depois, além de grotesco e tímido, ela ama outro. E é enfimo meu primeiro, o meu único amor... E note: eu nunca na realidade amei —sonhei. Passei a vida a sonhar que era amado — e nunca fui amado! Elaspassaram por mim na rua — extraordinárias, feitas às vezes de um nada debrancura, de um nada de sol, agasalhadas em peles sumptuosas — oudescalças e rotas com um seio que as iluminava como um dia de primavera —e nem sequer olhavam para mim... Mas eu não as esquecia: levava-as para casa— e sonhava com elas. Foram todas minhas amantes em sonho... Umas vezes,virgens e pudicas — outras vezes voluptuosas... À minha vontade, encerradona escuridão do cubículo, apertava-as nos braços, e violava-as como numsaque... E sonhei. E contentei-me em sonhar — até que deparei com estamulher que quero possuir. Agora que sou ignóbil, agora que só me resta amorte — encontro o meu sonho real e tangível. Amo-a de uma maneiraextraordinária, amo-a como quem se despede da vida.— Mas então diz-lho...— Repare para mim, olhe para mim. Seria bajulá-la. Não vê? Nãocompreende que a minha fealdade não é só por fora, mas por dentro? E nãopercebe que se ela calcasse aos pés este amor — o meu último amor — seriapara mim pior que a morte! Ela resume todas as mulheres que amei em sonhoe que nunca na realidade possuí. Eu nunca fui amado!

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