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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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Aos que se alimentam de sonho chega o momento em que não podemviver. A realidade não perde os seus direitos. Raia o dia em que se impõe porforça e então o sonhador é colhido e triturado por a ter esquecido. E o pontotrágico em que reconhece com espanto que não pode viver — que não sabeviver, e procura a morte, não para se aniquilar, mas como quem busca umsonho maior, um sonho sem contrariedades e de que se possa à vontadefartar.O drama de K. Maurício foi este — ter vivido tudo e nunca ter vivido; terconhecido a vida através dos livros e não saber dar um passo na vida.Habituar-se a sonhar e ter medo de viver.O sonho na verdade não tem contrariedades nem limites e a vida está cheiade asperezas. Por isso é bom e fácil sonhar. O pior é que quem se fartou dequimeras e de noites escarlates não pode habituar-se à existência banal; quemviveu com mulheres imaginárias não pode contentar-se com mulheres deviela. Muitas vezes o quis desviar desse caminho. E insistia:— Mas afinal que sonho é esse em que falas?— É para lá da vida, é a vida ideal. É talvez o céu. Em arte, é o livro que seentrevê e que gagueja, nunca atingindo o livro que imaginamos. É, em música,a aspereza em lugar dos sons e das vozes misteriosas que ouvimos em certashoras e que não podemos reproduzir.— Mas explica-me...

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