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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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torto, abririam risos de escárnio até na quimérica ventura de um noivado.Aquele pedaço de clowneria estrelava-lhe todo o resto da noite.Para que ela se não risse, fingia o amor (bem sentido e cavado na sua alma,na verdade), fazia da paixão um riso e de tudo o que tinha em si de ternura,como uma árvore que foi forca e se cobriu de floração — uma gargalhada.Não, não queria que ela se risse ou tivesse piedade, mas no feitio lambãoporque passava a mão pelo seu peito marmóreo e lácteo de estátua, paradepois chupar com gula os dedos, havia amarguras inéditas; no olhar raivas e,em todo o corpo desengonçado de clown, ímpetos de a morder e fugir comela presa nas garras.Um minuto de pausa: a mulher toda branca caiu outra vez sobre o dorso nudo cavalo; de dentro, com a lufada fresca do ar, veio o cheiro a cavalariçamisturar-se ao ruído das palmas. E logo a galopada, no estridor da música,recomeçou, e Camélia, como a fantasia de um poeta, verde, escarlate, asangrar como um crime, incarnou outra vez a quimera, sobre o cavalo negro eraivoso, e de rastos, agarrado às crinas do animal, o Palhaço desatou aosgritos, despedaçado de encontro à arena — restos de um amor do passado,ilusões mortas, venturas para sempre perdidas na lama e no esquecimento... Eas palmas da multidão caíram como granizo.

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