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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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divididos, de forma que tudo o que eu queria ser, os triunfos que sonhara, asgrandes coisas que imaginara, as vejo, as tenho aqui comigo, conforme aminha vontade omnipotente. E há dias em que me deito cedo, dizendo-me:Vou ser Deus! Deus!É por isto que eu fujo de conversar.Sou tão comediante, que nunca digo o que penso e o que sinto. Tambémnunca oiço o que os outros dizem, e, enquanto finjo escutar atento, penso noque vou dizer. Assim o que digo são restos de frases, palavras que trago nacabeça. E da conversa saio sempre humilhado e irritado...Desato a chorar com uma pena de mim!... Estou aqui, estou doido.Às vezes vou passear com outros e no fim de uma hora acordo persuadidode que tenho conversado muito. Na verdade tenho ido mudo: a conversa temsido comigo, sempre comigo, destacada, feita de pedaços, e não seidiscriminar onde começa o sonho e acaba a realidade...Eu nunca estou só. Quando me isolo é que estou mais acompanhado:torturas, sombras, ilusões...Quando, alta noite, na cidade toda negra, vejo uma janela que ainda luz, medigo: Tu, quem és, tece, tece, ainda que tudo seja vão, se quebrem os fios enada te reste por fim: tece, ainda que na engrenagem te vão ao certo pedaçosde coração, de nervos e de alma...

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