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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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Apagar uma luz é nada. É um facto insignificante e vulgar. Mas uma luz quearde há tantos séculos, dia e noite, uma luz que perpetua não sei que dor, quesuprema angústia ou que suprema esperança, faz-me pensar na vida e namorte.Do convento antigo resta a velha igreja de pedra e uma torre de granitocom ameias. A frialdade aqui dentro vem do claustro húmido, com doistúmulos encravados na parede, e deste conjunto de edificações sobrepostas.Até na igreja há acrescentos de diferentes épocas. A capela românica, metidana muralha, é talvez a igreja primitiva. Só se dá por ela ao pé do altar. Aabóbada é achatada, o granito de grão áspero esboroa-se, e já há muito que achuva, que se infiltra dos telhados, a teria arruinado se a não escorassemgrossas traves de castanho. Cheira aqui dentro a terra e a sepulcro, e oambiente, a escuridão palpável, põe-me em frente da grande realidade doalém.Sento-me para assistir à agonia da luz que arde há oito séculos, renovadanum subterrâneo pelas mãos dos vivos e dos mortos — e agora mesmo vaimorrer. Mais uns minutos passam, o tempo roda e a agonia irrisória deste fiode luz prolonga-se e assume no meu espírito proporções de tragédia. Parecemeque outra coisa maior vai morrer no mundo. Para todo o sempre, a dorque a acendeu e a sustentou ao lume da vida vai desaparecer na treva espessa.Outra morte maior avança, mais calada, mais profunda — a morte definitiva...Só faltam alguns segundos. A camada de azeite, fina como um papel, reduz-se

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