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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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Muitas vezes me contou com redondos olhares de inveja as suas noites noCirco... (Decididamente eu hoje não posso fingir e escrever como das outrasvezes. Muito me hei de eu rir, quando eles lerem a história da minha alma!...)Na claridade branca dos refletores, ele fez intermédios que faziam mal: quister génio à força, e as suas farsas afinal, longo e rapado, incomodavam comoum remorso. Lembrava misérias, deboches a uivarem com fome, e eralamentável e triste como uma tumba. De chapéu alto e casaca enorme, rígido elongo, parecia um cadáver fugido ao cemitério. Pouco a pouco empregaramnoem serviços ridículos: era ele quem levava pontapés dos outros palhaços, e,como ninguém lhe dava palmas, tiveram de o pôr na rua, porque metiamedo...Começou então a sua vida de miséria. Com um usado tapete, um fato demascarada e uma cabeleira de três pontas, foi de rua em rua a pedir esmola e aclownear. Foi assim que eu o conheci, e só eu com ferocidade me ria, não dassuas farsas, mas da sua alma e da sua desgraça — para ter que me rir dealguém, para me vingar nele da minha nulidade — e para me rir de mim!... (Euhoje escrevo muito mal, tenho nos ouvidos sempre esta zoeira, e não me largaa ideia de que endoideço...)Velho, com fome, enquanto outros na claridade dos circos eramaplaudidos! Que raiva de morte! Ainda se se tem consciência de ter génio!...Mas assim: com a certeza da nulidade, da miséria, da velhice, quando háalguém que triunfa e que é belo!... E ver-se a gente, por dentro, odiento,

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