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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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CAPÍTULO IA CASA DE HÓSPEDESSingular ligação a destes tipos que o acaso reunia naquela casa de hóspedesda D. Felicidade: um doido, um anarquista, o Pita, a patroa, o Gregório,antigo chefe de repartição, que havia anos estava encarangado num quarto,uma velha que só saía de noite, e essa figura amarga, o Palhaço, que passavahoras como se só a si próprio se escutasse. Todos tinham chegado ao fim davida, de unhas arrepeladas para o gozo, com o aspeto das coisas servidas quese deitam fora. Usados pela existência, pela ambição e pela febre, arregalavamos olhos para a vida. Neles havia o que quer que era que inquietava e faziapensar. Em vez de ficarem de uma secura atroz, tendo analisado de pertotodos os sentimentos, o amor e a amizade, a experiência dera-lhes tintas desonho ao desespero: e era como se um bicho de esgoto criasse asas e sepusesse a voar. O Doido sonhava — e todas as suas visões vagas caminhavamnuma atmosfera de beleza, para de súbito, num pormenor, ficarem grotescas,aos pulos como um sapo. O Anarquista tinha gestos de profeta, e na suaeloquência havia rasgos de visionário: como um vendaval que arrombavaportas, assim ela entrava pelo sonho dentro, engrandecida. Evocava asmultidões, a miséria humana, a dor humana. O Pita era um misto de filósofo ede ladrão. Sabia tudo, vendia tudo. Amara princesas e trazia um velho xaile-

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